A eficácia do pensamento platônico não carece de demonstração. Platão morreu em 347 antes de nossa era. Desde então, a cultura não cessou de referir-se a ele, para nele se inspirar, para criticá-lo, para tentar ultrapassá-lo. Sua obra se ergue, inelutavelmente, no horizonte de toda investigação teórica, outrora, mais recentemente e hoje. A arte, a literatura, que nela se alimentaram, não podem hoje nem tampouco ontem ignorá-la. De todos os pensadores, ele foi certamente o que teve a maior, a mais profunda, a mais durável influência. A que se deve um tal êxito? Qual a razão dessa perenidade do platonismo, que resistiu — retomado, desfigurado, enaltecido — a todos os assaltos das vagas que atravessaram a cultura ocidental, da predicação de Cristo às máximas utilitaristas da civilização industrial? Qual a razão que faz com que seja finalmente em torno dessa obra, tão longínqua que parece fora do tempo, que atualmente ainda se inflamem as paixões, positivas ou negativas, de todos os amantes do pensamento? Não há uma resposta formal para tais questões. Basta fazer referência à situação efetiva e às ideologias correspondentes que Platão devia enfrentar e analisar a significação da decisão que então tomou para compreender por que seu texto permanece como um modelo e, ao mesmo tempo, uma solicitação a se fazer outro tanto e a se ir além. Os diálogos platônicos não podem ser desligados do tempo que os viu nascer; a conjuntura histórica é aqui determinante. Destacá-los desse contexto estreitamente concreto, fazer deles uma das primeiras manifestações do espírito eterno, é condenar-se a nada compreender de sua originalidade e dessa forma que lhes permitiu atravessar a história. Platão é um ateniense do século IV, decepcionado com sua Cidade. Ora, é precisamente essa decepção e o projeto teórico que suscita que estão na origem da durabilidade do platonismo. Como é isso possível? Como conceber que uma obra tão fortemente marcada pelas circunstâncias possa estar presente a nós a esse ponto? Por que razão o grego clássico Platão coloca, ainda e sempre, problemas que são os nossos? É precisamente a essas questões que tentaremos responder, lembrando os temas fundamentais do pensamento platônico, mostrando como se articulam. Por que somos, quer queiramos, quer não, quer nos irritemos, quer nos alegremos com isso, hoje ainda discípulos de Platão? Em que o somos? Como é possível que esse escritor, que falava há vinte e quatro séculos, fale já de nós e tão bem? [Excerto do estudo sobre Platão, Platon, de François Châtelet]