Sof 241b-242b: Necessidade de criticar a negação do Não-ser

Estrangeiro – Bem lembrado. Porém passemos a considerar o que será preciso fazer com o sofista. Se insistirmos em procurá-lo na classe dos falsos obreiros e charlatães, bem vês como as dificuldades e as objeções nos surgem aos montes.

Teeteto – Sem dúvida; em grande quantidade, mesmo.

Estrangeiro – E note-se que só nos ocupamos com uma parte mínima, porque elas são, a bem dizer, infinitas.

Teeteto – Se é assim, nunca apanharemos o sofista.

Estrangeiro – Como! Vamos desistir do nosso propósito, só por comodidade?

Teeteto – Não por minha causa, enquanto houver um pingo de possibilidade de segurar nosso homem.

Estrangeiro – Pelo que declaraste agora mesmo, mostrar-te-ás indulgente, e até satisfeito, se conseguirmos afrouxar um pouquinho a pressão desse argumento tão obstinado?

Teeteto – Como não mostrar-me?

Estrangeiro – .Porém ainda quero fazer-te outro pedido.

Teeteto – Qual será?

Estrangeiro – Não me teres na conta de parricida.

Teeteto – Como assim?

Estrangeiro – Por nos vermos forçados, para defender-nos, a pôr à prova a tese de nosso pai Parmênides e arrancar a conclusão de que, seja como for, o não-ser existe, e que o ser, por sua vez, de algum modo não existe.

Teeteto – Evidentemente, essa é a tese que precisamos debater em nossa discussão.

Estrangeiro – Sim, até um cego, por assim dizer, fora capaz de enxergar isso, pois, a menos que a aceite ou a refute, ninguém poderá falar de discursos ou opiniões falsas, ou de simulacros e de imagens, de imitações e de aparências, nem das respectivas artes, sem cometer o ridículo de cair nas mais grosseiras contradições.

Teeteto – É muito certo o que dizes.

Estrangeiro – Por isso, precisamos ter a coragem de refutar desde já a tese paterna, ou, no caso de termos escrúpulo, abandonar definitivamente o assunto.

Teeteto – Nada nos impede de proceder dessa maneira

Estrangeiro – Então, pela terceira vez vou apresentar-te uma perguntazinha.

Teeteto – Bastará falares.

Estrangeiro – Disse há pouco que me considero absolutamente inapto para semelhantes refutações, o que se comprovou agora mesmo.

Teeteto – Sim, já o disseste.

Estrangeiro – Depois de confissão tão franca, receio que me chames de louco por tomar posição diametralmente oposta. Só para ser-te agradável, tentemos refutar a proposição, se é que conseguiremos nosso intento.

Teeteto – De minha parte, não receies nenhum reparo, se te abalançares a coligir provas para o debate. Cria coragem, pois, e principia.