Apologia 20c-24b: Investigação de Sócrates sobre o oráculo de Delfos

Algum de vós, aqui, poderia talvez se opor a mim: – Mas Sócrates, que é que fazes? De onde nasceram tais calunias? Se não tivesses te ocupado em coisa alguma diversa das coisas que fazem os outros, na verdade não terias ganho tal fama e não teriam nascido acusações. Dizes, pois, o que é isso, a fim de que não julguem a esmo.

Quem diz assim, parece-me que fala justamente, e eu procurarei demonstrar-vos que jamais foi essa a causa produtora de tal fama e de tal calúnia. Ouvi-me. Talvez possa parecer a algum de vós que eu esteja gracejando; entretanto, sabei-o bem, eu vos direi toda a verdade. Porque eu, cidadãos atenienses, se conquistei esse nome, foi por alguma sabedoria. Que sabedoria é essa? Aquela que é, talvez propriamente, a sabedoria humana. É, em realidade, arriscado ser sábio nela: mas aqueles de quem falávamos ainda há pouco seriam sábios de uma sabedoria mais que humana, ou não sei que dizer, porque certo não a conheço. Não façais rumor, cidadãos atenienses, não fiqueis contra mim, ainda que vos pareça que eu diga qualquer coisa absurda: pois que não é meu o discurso que estou por dizer, mas refiro-me a outro que é digno de vossa confiança. Apresento-vos, de fato, o deus de Delfos como testemunha de minha sabedoria, se eu a tivesse, e qualquer que fosse. Conheceis bem Xenofonte. Era meu amigo desde jovem, também amigo do vosso partido democrático, e participou de vosso exílio e convosco repatriou-se. E sabeis também como era Xenofonte, veemente em tudo aquilo que empreendesse. Uma vez, de fato, indo a Delfos, ousou interrogar o oráculo a respeito disso e – não façais rumor, por isso que digo – perguntou-lhe, pois, se havia alguém mais sábio que eu. Ora, a pitonisa respondeu que não havia ninguém mais sábio. E a testemunha disso é seu irmão, que aqui está.

Considerai bem a razão por que digo isso: estou para demonstra-vos de onde nasceu a calúnia. Em verdade, ouvindo isso, pensei: que queria dizer o deus e qual é o sentido de suas palavras obscuras? Sei bem que não sou sábio, nem muito nem pouco: o que quer dizer, pois, afirmando que sou o mais sábio? Certo não mente, não é possível. E fiquei por muito tempo em dúvida sobre o que pudesse dizer; depois de grande fadiga resolvi buscar a significação do seguinte modo: