====== Sofista 262d-263d: Ligação constitutiva do discurso ====== Estrangeiro – E assim como entre as coisas umas em parte se combinam e outras não: da mesma forma há sinais vocais que não se combinam; mas os que o fazem dão origem à sentença. Teeteto – Perfeitamente. Estrangeiro – Ainda falta uma coisinha de nada. Teeteto – Que é? Estrangeiro – É que a sentença, desde que se forma, por força terá de referir-se a alguma coisa; sentença de nada é que não é possível haver. Teeteto – Isso mesmo. Estrangeiro – Como também terá de ser de certa natureza. Teeteto – Como não? Estrangeiro – Tomemo-nos a nós mesmos como objeto de exame. Teeteto – Sim, façamos isso. Estrangeiro – Vou formular uma sentença em que um sujeito e uma ação se combinam por meio de um nome e um verbo. A ti é que competirá dizer a que se refere a sentença. Teeteto – Farei o que puder. Estrangeiro – Teeteto está sentado. Não é longa, pois não? Teeteto – Não; é bem razoável. Estrangeiro – Cabe a ti, agora, dizer a quem se refere a sentença e de que se trata. Teeteto – Evidentemente, fala de mim e se refere a mim mesmo. Estrangeiro – E esta outra? Teeteto – Qual? Estrangeiro – Teeteto, com quem converso neste momento, voa. Teeteto – Desta, também, outra coisa não se poderá dizer, se não for que fala também de mim e a meu respeito. Estrangeiro – Porém já dissemos que toda sentença terá de ser, por força, de uma certa natureza. Teeteto – Sim. Estrangeiro – E como diremos que seja a natureza de cada uma dessas sentenças? Teeteto – Uma delas, de algum modo, é falsa; a outra, verdadeira. Estrangeiro – Das duas, a verdadeira diz de ti as coisas como realmente são. Teeteto – Sem dúvida. Estrangeiro – E a falsa, diferentes da realidade. Teeteto – Certo. Estrangeiro – Logo, fala de coisas não existentes ti como se existissem? Teeteto – Quase. Estrangeiro – A saber, como existentes, porém diferentes das que existem com relação à tua pessoa, pois já dissemos que com relação a cada coisa há muitos seres e muitos não-seres. Teeteto – Perfeitamente. Estrangeiro – Quanto à segunda sentença que formulei a teu respeito, de acordo com a definição apresentada antes, para começar, é de toda a necessidade que seja concisa. Teeteto – De fato, esse ponto já ficou assentado. Estrangeiro – Depois, que se refira a alguém. Teeteto – Sem dúvida. Estrangeiro – E que se não se referir a ti, não se referirá a mais ninguém. Teeteto – Como não? Estrangeiro – Se não se referisse a ninguém, de jeito nenhum poderia ser sentença, pois já mostramos não ser possível discurso de nada. Teeteto – Certíssimo. Estrangeiro – Assim, quando se fala a teu respeito, porém tratando de coisas outras como sendo as mesmas e do que não é como sendo, semelhante combinação, ao que parece, de substantivos e de verbos é, de fato e verdadeiramente, um falso discurso. Teeteto – Muitíssimo certo.