Enéada VI, 1, 27 — O sujeito e o substrato

Eles deveriam ter procedido de outra forma, mantendo o princípio do conjunto das coisas no lugar de honra, em vez de postular como princípio o que é desprovido de forma, o que é passivo, o que não tem parte na vida, o que é privado de intelecto, o que é obscuro e o que é indefinido, e de atribuir a realidade verdadeira a essa coisa. Eles introduzem o deus para salvar as aparências, mas é um deus que tem seu ser da matéria, que é um composto e que vem em segundo lugar, ou antes não é senão matéria disposta de certa maneira. Além disso, se a matéria é um substrato, deve haver algo mais que, estando no exterior, aja sobre ela e a faça o substrato das coisas que ela envia para a matéria. Em contrapartida, se o deus se encontrasse ele mesmo como substrato na matéria e se ele viesse por si mesmo a unir-se a ela, ele não faria mais da matéria um substrato e ele não seria mais ele mesmo um substrato conjuntamente com a matéria. Pois de que seriam eles substratos, ele e a matéria, já que não restaria mais nada para fazer deles substratos, dado que todas as coisas teriam sido absorvidas nesse pretenso substrato? Um substrato é substrato em relação a algo, não com o que se encontra em si mesmo, mas com o que age sobre ele que então detém o papel de substrato; o substrato é substrato relativamente ao que não é substrato. Se é assim, se é substrato relativamente ao que é exterior a ele, é preciso então dar um lugar a esse termo. Mas se eles não precisam de nada exterior, e se, ao contrário, o substrato é capaz de se tornar todas as coisas recebendo figuras, como o dançarino que na dança se faz ele mesmo todas as coisas, então ele não é mais um substrato, mas ele é ele mesmo todas as coisas. Pois, como o dançarino não é um substrato para as figuras que executa – já que o conjunto do que ele representa é seu ato –, da mesma forma o que eles chamam a matéria não será tampouco um substrato para todas as coisas, se todo o resto vem dela. Ou antes, as outras coisas em geral nem sequer existirão, se elas são efetivamente apenas modos de ser da matéria, como são modos de ser do dançarino as figuras que ele executa. Mas se as outras coisas não existem, a matéria não será de forma alguma um substrato, e ela nem sequer fará parte dos seres, mas não sendo nada além de matéria, ela não será por isso mesmo sequer matéria. A matéria, de fato, é um relativo. E o relativo está em relação com outro termo do mesmo gênero, por exemplo o dobro em relação à metade, e não a realidade em relação ao dobro. Mas como o ser pode estar em relação com o não-ser senão por acidente? Ora, o que em si mesmo é um ser – e a matéria é um ser – é com um ser que isso deve estar em relação. Pois se o correlativo é potência, isto é, algo que deve ser, e se não é uma realidade, então a matéria não é ela mesma uma realidade. É o resultado ao qual chegam aqueles que, enquanto acusam seus adversários de fazer provir a realidade do que não é realidade, fazem eles mesmos provir o que não é realidade da realidade. Pois o mundo enquanto mundo não é a realidade. É absurdo dizer que a matéria que é substrato é uma realidade, e não considerar com mais forte razão que os corpos e mesmo o mundo não sejam realidades, senão na medida em que uma de suas partes é realidade. É igualmente absurdo dizer que o ser vivo tem sua realidade não de sua alma, mas apenas da matéria, e que a alma é o resultado de uma afecção da matéria e que ela vem depois dela. De onde vem, então, que a matéria é animada, e de forma geral de onde vem a existência da alma? E como explicar que a matéria se torne às vezes corpos, enquanto outra parte dela se torna uma alma? Pois, mesmo que a forma viesse de outro lugar, a simples adição de uma qualidade à matéria nunca a faria uma alma, mas apenas corpos desprovidos de alma. Mas se algo modelasse a matéria para dela fazer uma alma, antes da alma a nascer haveria a alma que a produz.