Enéada VI, 3, 15 — O igual e o desigual são o próprio da quantidade
– Mas como Aristóteles pode dizer que «o igual e o desigual são próprios da quantidade»? Fala-se de triângulos semelhantes, não é? – Sim, e fala-se também de grandezas semelhantes, e a similitude de que se fala não impede o semelhante e o dissemelhante de se encontrarem na qualidade, pois aqui, no caso das grandezas, «semelhante» tem, suponho, um sentido totalmente diferente do que no caso da qualidade. Além disso, se ele diz que «o igual e o desigual são próprios da quantidade», ele não proíbe predicar o semelhante a certas grandezas. – Na verdade, se ele diz que «o semelhante e o dissemelhante são próprios da qualidade», então, como acabamos de lembrar, é preciso que «semelhante» seja tomado em outro sentido quando se aplica à quantidade. Em contrapartida, se é no mesmo sentido que «semelhante» se aplica também às quantidades, é preciso procurar saber se existem outros «próprios» para cada um desses gêneros, a quantidade e a qualidade. – A essa questão, é preciso responder que «semelhante» se diz também da quantidade, enquanto essas diferenças específicas se encontram nela, e porque, em regra geral, é preciso colocar as diferenças que ajudam a completar algo sob aquilo de que elas são diferenças, e notadamente no caso em que a diferença específica enquanto diferença específica pertence apenas a essa coisa. Mas se a diferença específica contribui para completar a realidade em um caso, mas não no outro, ela deve no primeiro caso ser subordinada a ela, enquanto, no outro caso, é preciso considerá-la apenas em si mesma. Quero falar não do que completa pura e simplesmente a realidade, mas do que completa «tal» realidade, a palavra «tal» indicando que a adição não provém da realidade enquanto realidade. É preciso também notar que dizemos que este triângulo e este quadrilátero são iguais e que aplicamos esse qualificativo a todas as figuras, planas ou sólidas. Sendo assim, é preciso postular que o igual e o desigual são próprios da quantidade. Mas é preciso procurar saber se o semelhante e o dissemelhante pertencem à qualidade. Sobre a qualidade, disse-se que, misturada com essas duas coisas, a matéria e a quantidade, ela contribui para completar a realidade sensível, e que essa suposta realidade corre o risco de ser feita de várias coisas, e de não ser apenas «algo», mas sim «algo qualificado». E a «razão», a do fogo, por exemplo, indica antes um «algo», mas a forma que ela coloca em obra é antes uma qualidade. E a «razão», a de um homem, é um «algo», mas o que encontra sua realização na natureza de um corpo que é a imagem dessa «razão» é antes um «algo semelhante». É como se, enquanto Sócrates é esse homem que se vê, chamássemos Sócrates seu retrato, uma imagem dele fabricada com pigmentos coloridos. Da mesma forma, portanto, já que há uma «razão» que faz com que Sócrates exista, o Sócrates sensível não pode com razão ser chamado «Sócrates», e é preciso antes dizer que o Sócrates sensível é feito de cores e de formas que são as imagens do que há em sua «razão», e que essa «razão» já mantém a mesma relação com essa «razão» que é a mais verdadeira, a do homem. É isso sobre este ponto.
