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Exposição da opinião de Platão sobre a forma antiga do homem (Ficino)

Ficino, 1594

Aristófanes narra esses e outros acontecimentos igualmente prodigiosos e portentosos, sob os quais, como véus, escondem-se mistérios divinos. Era costume dos antigos teólogos encobrir seus segredos sagrados e puros com sombras de figuras, para que não fossem profanados pelos impuros. De fato, não devemos pensar que os eventos descritos nessas imagens anteriores correspondem plenamente ao sentido literal. Como afirma Santo Agostinho, nem tudo o que se representa tem necessariamente um significado, pois muitos elementos foram adicionados apenas para favorecer a ordem e a coerência. Assim como a terra é arada pela lâmina do arado, mas necessita de outros componentes para que isso aconteça, essa é a essência do que nos propomos a expor.

Antigamente, os seres humanos tinham três sexos: masculino, feminino e misto, filhos do sol, da terra e da lua. Eram seres íntegros, mas, devido à sua soberba e à tentativa de se igualar a Deus, foram divididos em duas partes. Se voltassem a se envaidecer, seriam novamente fragmentados. Após essa divisão, a metade de cada um passou a ser atraída pela outra metade por meio do amor, para restaurar sua integridade. Quando essa unidade for recuperada, a humanidade atingirá a felicidade plena.

O resumo de nossa exposição é o seguinte: os homens, ou melhor, as almas humanas, no momento de sua criação por Deus, eram inteiras e adornadas por duas luzes—uma inata e outra infusa. A luz natural permitia a contemplação de coisas iguais e inferiores, enquanto a luz infusa possibilitava a contemplação do divino. Ao tentar se igualar a Deus, os seres humanos passaram a se inclinar apenas para a luz inata, perdendo, assim, o esplendor infuso. Esse afastamento levou à queda nos corpos físicos. Se voltassem a se envaidecer, seriam novamente fragmentados, pois confiar em excesso no intelecto natural pode levar à extinção dessa luz inata.

Os três sexos humanos derivavam de diferentes fontes: os masculinos do sol, os femininos da terra e os mistos da lua. Cada um recebeu um fulgor divino correspondente a uma virtude: a fortaleza, no caso dos masculinos; a temperança, para os femininos; e a justiça, para os mistos. Essas três virtudes humanas são reflexos das três virtudes divinas. Em Deus, são simbolizadas pelo sol, pela lua e pela terra; na humanidade, correspondem aos sexos masculino, feminino e misto.

Após a divisão, cada metade foi impulsionada pelo amor em busca da outra. As almas, já separadas e imersas nos corpos, ao atingirem a adolescência, por meio da luz natural que conservaram, são levadas a recuperar sua luz divina e infusa—essa mesma luz que já foi parte delas antes da queda. Ao recuperá-la, tornar-se-ão novamente plenas e felizes pela visão de Deus. Esse é, portanto, o resumo de nossa interpretação.

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