Enéada II, 1, 3 — Imortalidade: o corpo do mundo e do céu

3. Como pois apesar de sua fluidez constante, cooperam à imortalidade do mundo a matéria e o corpo do universo? Porque o corpo (flui), diríamos, mas não para fora; permanece no universo e não sai de modo algum dele, não sofrendo igualmente nem aumento nem diminuição; portanto, tampouco envelhece. Convém advertir que a terra se conserva eternamente em sua forma e em sua massa, sem que seja abandonada jamais pelo ar ou a natureza da água, pois nem a transformação destes elementos é capaz de alterar a natureza do ser universal. E, embora estando em incessante mudança (pela penetração e a saída das distintas partes do corpo), cada um de nós permanece por longo tempo, enquanto no mundo, ao qual nada vem de fora, a natureza do corpo não mostra inconveniente em unir-se à alma e formar assim um ser idêntico a si mesmo e subsistente para sempre. Quanto ao fogo, é sutil e rápido porque não pode subsistir aqui; e igual ocorre com a terra, que não pode permanecer no alto. Mas não temos de pensar que, uma vez chegado o fogo ali onde deve deter-se e assentado: em seu lugar apropriado, não trate de buscar, como os demais elementos, sua própria estabilidade nos dois sentidos; não poderia no entanto, dirigir-se ao alto, porque isto é ilógico, e orientar-se até abaixo iria contra sua natureza. Só lhe resta mostrar-se dócil e adaptar-se naturalmente à atração que exerce a alma sobre ele; e assim, para alcançar a felicidade, terá de se mover em uma região formosa qual é a da alma. Convirá confiar em que não caia, pois o movimento circular da alma se antecipa a sua queda para a terra, retendo-o com toda sua força. E como, por outra parte, não tem por si mesmo nenhuma propensão a descer, permanece sem oferecer resistência. Por sua vez, as partes de nosso corpo que receberam a forma, não conservam a disposição adquirida, e o corpo, se quer subsistir, reclama outras partes que venham de fora; o céu, por outro lado, nada desprende de si e portanto não tem necessidade de alimento algum. Porque, se o fogo do céu se extinguisse, outro fogo teria de acender-se: e se o céu encerrasse algo, realmente fluente, outra coisa, sem dúvida, viria a substituí-lo. Mas, em ambos os casos, o ser animado universal não permaneceria já como idêntico e ai mesmo.