Enéada VI,9,4 — O Uno é além da ciência e do conhecimento intelectual

Capítulo 4: O Uno é além da ciência e do conhecimento intelectual.
1-10. A ciência e o conhecimento implicam a multiplicidade.
10-16. Não se pode portanto nem falar nem escrever a respeito do uno.
16-35. Para alcançar À contemplação do Uno, é preciso ir além do conhecimento intelectual.

4. A aporia nasce sobretudo porque nossa apreensão do Uno não se faz nem por meio da ciência nem por meio da intelecção, como é o caso para os outros inteligíveis, mas que ela resulta de uma presença que é superior à ciência. Ora, a alma faz a experiência de sua falta de unidade, e ela não é mais totalmente una, quando ela adquire a ciência de algo; pois a ciência é um discurso, e o discurso é múltiplo. Logo ela abandona a unidade e cai no número e na multiplicidade. É preciso então se lançar além da ciência e não sair de nenhuma maneira da unidade; é preciso também se afastar da ciência e de seus objetos, como de todo outro objeto de contemplação, mesmo do belo. Pois tudo que é belo é posterior ao Uno e vem dele, como toda a luz do dia vem do sol. Eis porque Platão diz que não se pode nem «falar» nem «escrever» a respeito dele, mas que, se falamos e escrevemos, é para conduzir a ele e para despertar à contemplação a partir dos discursos, como se indicássemos o caminho àquele que quer alcançar à contemplação. Pois o ensinamento não pode indicar senão a via e o caminho; a contemplação ela mesma, é àquele que quer contemplar que cabe doravante de pô-la em obra. Mas se alguém não alcançou à contemplação, se sua alma não tomou consciência do esplendor de lá, se não experimentou nem fez nele mesmo uma experiência semelhante à paixão amorosa do amante que, em olhando o objeto de seu amor, encontra seu repouso nele, porque recebeu uma luz verdadeira que ilumina de todas as partes a alma inteira, o que se explica porque ele disto se aproximou, mesmo se é ainda retido na sua subida por um peso que faz obstáculo à contemplação, pois não sobe só, mas porta ainda com ele o que o separa do Uno e ele ainda não se reuniu em uma unidade (certamente, o Uno não está ausente de nada e é ausente de todas as coisas, de sorte que, presente, não está presente, salvo naqueles que podem e que são preparados a recebê-lo de maneira a se ajustar a ele, e, por assim dizer, a tocá-lo e a abraçá-lo em virtude da semelhança que têm com ele, quer dizer do poder que cada um possui e que é do mesmo gênero que esse que vem dele; quando se encontra na condição que se estava quando se é vindo dele, pode-se doravante o ver, da maneria pela qual, por natureza, ele pode ser contemplado); se aquele que quer contemplar não está portanto ainda lá, mas que permanece no exterior, seja pelas razões precedentes seja por causa da insuficiência do raciocínio que o guia e lhe dá confiança, é preciso que se tome a si mesmo por isso, e que se tente permanecer só, em se afastando de todas as coisas; quanto ao que não se crê ainda porque se negligencia nossos discursos, que se considere o que segue.