Eros e Psique 8

MITOLOGIA — EROS E PSIQUE
CAPÍTULO 8
Enquanto isso, Psique continuava sua triste peregrinação, buscando noite e dia pelo esposo. Quanto mais desespero sentia na alma, tanto mais sequioso de amor ficava também o encolerizado Eros, visto sentir falta do amor da esposa para aplacar-lhe os desejos; também não conseguia satisfazer-se com os favores obtidos de uma escrava.

Quando Psique avistou um templo no alto de uma montanha, disse para si mesma: “Se ao menos eu soubesse que é lá que se oculta o meu senhor!”

No mesmo instante, esquecido o cansaço por serem tão grandes a esperança e o desejo, dirigiu-se para lá com passos apressados. Depois de alcançar o cume, tendo obstinadamente escalado a encosta íngreme, entrou diretamente no templo divino. Viu espigas de trigo e de cevada empilhadas num monte e outras trançadas em forma de guirlandas. Também havia foices e todos os instrumentos necessários à colheita; contudo, estavam todos esparramados na mais completa desordem, tal como os ceifadores costumam abandoná-los quando chega o calor do verão. Psique arrumou tudo com muito cuidado, na crença compreensível de que não se deve negligenciar nenhum templo, pertença ele a qualquer deus, nem descuidar de seus rituais, mas que se deve pedir pela graça geral de todos eles.

Enquanto cuidava de organizar tudo, eis que Deméter se aproxima e, ao encontrá-la, clama em voz alta:

— É possível que sejas Psique tão digna de pena? Vênus procura enraivecida e encolerizada pela tua pista em todo o mundo, pedindo a todos os que te encontrarem para que recebas os mais cruéis castigos; ela exige vingança contra ti, usando para tal todos os poderes da sua condição de deusa. Tu, no entanto, te ocupas agora com as minhas coisas em vez de tentar salvar a tua pele?

Então Psique arremessa-se aos pés da deusa, chorando copiosamente, molhando até as sandálias de Deméter e varrendo o chão com os cabelos. Ela lhe pede, através das súplicas mais ardentes, que a deusa tenha piedade:

— Por tua mão direita que despende fertilidade, te suplico, pelos alegres rituais que acompanham as colheitas, pelos segredos ocultos nas arcas, pelo teu carro transportado pelas tuas serviçais serpentes, pelos sulcos das glebas da terra siciliana, pelo belo carro fúnebre de Hades, pela terra que nos sustenta, pela descida de Perséfone às núpcias sombrias e pela ressurreição da filha para o reencontro luminoso, por tudo o mais que cobre de mistério a tua morada no Elêusis: ajuda a alma digna de pena desta Psique que te suplica com toda a humildade! Permite que me esconda por uns poucos dias no meio dos montes de espigas de trigo, até que se abrande a fúria da grande deusa devido à passagem do tempo e à grande distância, ou ao menos permite que eu recupere as forças do grande cansaço que me ocasionou a perda da paz.

Mas Deméter contradiz:

— Com tuas súplicas regadas a pranto sinto-me de fato comovida e gostaria de poder ajudar-te; mas não posso cair no desagrado dos meus parentes sanguíneos, com os quais tenho um antigo pacto de amizade. Portanto, sai logo do meu templo e fica contente pelo fato de eu não te reter e não te mandar seguir.

Vendo malograr suas esperanças e abatida por dupla tristeza, Psique retoma o caminho de volta e vê no vale, no sopé da montanha, no meio do bosque, um santuário construído com bastante arte; e como não se apresentasse outro caminho, mesmo que esse fosse duvidoso no que se referia à esperança, resolveu pedir a misericórdia do deus ao qual pertencia; aproximou-se assim do pórtico sagrado. Viu maravilhosos presentes e vestidos bordados com letras douradas pendurados nos ramos das árvores e nos postes, ofertas de agradecimento dedicadas à deusa à qual eram consagradas. Então Psique abraça de joelhos o altar ainda quente, depois de secar as lágrimas e suplica:

— Irmã e esposa do grande Júpiter: tu que és honrada em Samos somente por teu nascimento, por teu primeiro vagido e criação, e que és encontrada nos templos antigos; tu que visitas os felizes lugares da alta Cartago onde te veneram como a virgem que viaja para o céu num carro atrelado com leões; tu que velas pelos famosíssimos muros de Argos, às margens do Inaco onde te aclamam há muito como a rainha dos deuses e a esposa do trovão; tu, que todo o Oriente venera como a protetora dos casamentos e todo o Ocidente como a fornecedora da luz. Sejas, Hera, tu a salvadora da minha terrível queda e liberta-me daqueles sofrimentos e contínuos esforços causados pelo medo que sinto do perigo que me ameaça! Tanto quanto sei, costumas ajudar de boa vontade a evitar riscos durante a gravidez.

À suplicante, apresentou-se Hera com toda a dignidade de sua majestosa divindade e lhe disse:

— Como gostaria — disse ela -, dou-te a minha palavra, de adaptar minhas ordens às tuas súplicas! Mas contra a vontade de Vênus, minha sogra, a quem sempre amei como filha, me impede a vergonha de agir. Além disso, também estou de mãos atadas pelas leis que não permitem que escravas fugitivas estrangeiras sejam acolhidas contra a vontade de seus donos.

Desesperada com esse novo naufrágio de sua felicidade, e vendo malograr todos os seus esforços de descobrir o alado marido, Psique desiste de toda esperança de salvação e tenta resolver-se, travando consigo mesma o seguinte monólogo:

“Que outra ajuda podes esperar para a tua labuta, a quem mais podes recorrer, se nem sequer pudeste contar com a boa vontade das deusas? Presa nessa armadilha, para onde caminhar, e sob que teto ou em que escuridão queres te ocultar para fugires aos penetrantes olhares da grande Vênus? Por que, Psique, não te resolves e desiste de todo e qualquer resquício de esperança e te entregas voluntariamente à tua senhora, tentando mitigar-lhe o ódio, mesmo que com tua tardia submissão? Quem sabe não encontrarás no palácio da mãe aquele por quem tanto procuras?”

Assim, preparada para uma desastrosa rendição, mas mais preparada ainda para uma queda evidente, Psique pensa em como iniciar a provação que tem à frente.