Filebo 39c-40e — Um prazer ou uma dor são opiniões sobre o futuro

Sócrates – Se estiver tudo certo tudo o que dissemos até aqui, precisaremos examinar ainda o seguinte ponto.

Protarco – Qual?

Sócrates – Se as ocorrências presentes e passadas produzem necessariamente esses efeitos em nós, porém não as frutas.

Protarco – O mesmo se dará em qualquer tempo com todas.

Sócrates – Há pouco falamos dos prazeres e das dores que nos vêm por intermédio da alma e podem anteceder as que provém do corpo, do que resulta termos prazeres ou sofrimentos antecipados.

Protarco – É muito certo.

Sócrates – E as letras e as pinturas que há momentos admitimos existir dentro de nós, só serão válidas para o tempo presente e o passado, não para o futuro?

Protarco – Também valem, e muito, para o futuro.

Sócrates – quando falamos em muito, com relação ao futuro, referes-te a esperanças, no sentido de atravessarmos a vida cheio delas?

Protarco- Perfeitamente.

XXIV – Sócrates – Então, e em aditamento o que ficou dito, responde mais uma pergunta.

Protarco – Qual?

Sócrates – O homem justo e pio inteiramente bom , não é amado dos deuses?

Protarco – Como não?

Sócrates – E com o injusto e ruim de todo, não se passa precisamente o contrário disso?

Protarco – Sem dúvida.

Sócrates – E, como dissemos há pouco, todos os homens estão cheios de esperanças.

Protarco – Isso mesmo.

Sócrates – Logo, em cada um de nós há certos discursos que denominamos esperanças?

Protarco – Há.

Sócrates – E também imagens pintadas. A esse modo, poderá alguém ver-se como possuidor de muito ouro, com seu cortejo inseparável de prazeres, e fonte, para ele, de grande satisfação; como verá sua própria pintura em estado de acentuada euforia.

Protarco – Sem dúvida.

Sócrates – Sendo assim, estamos autorizados a dizer a esse respeito que na maioria dos casos as imagens assim escritas no interior dos homens de bens são verdadeiras, e que os homens maus se dá precisamente o contrário disso. Ou não diremos?

Protarco – É o que precisaremos dizer, sem dúvida.

Sócrates – Da mesma forma, os maus carregam no infinito essas pinturas de prazeres, com a diferença de serem prazeres falsos.

Protarco – Sem dúvida.

Sócrates – Assim , na maioria das vezes os maus se alegram com os prazeres falsos e os varões de bens, como verdadeiros.

Protarco – Eis uma conclusão irrefutável.

Sócrates – De acordo, pois, com o presente argumento, na alma do homem há prazeres falsos, ridículas imitações dos verdadeiros, o mesmo acontecendo com as dores.

Protarco – Certo.

Sócrates – Ora, como já demonstramos, pode bem acontecer que as opiniões formadas por determinadas pessoa não se relacionem com nenhum objeto existente ou que ainda venha existir.

Protarco – Sem dúvida.

Sócrates – A meu parecer, esse é o motivo de haver falsas opiniões e de opinarmos falsamente, não é assim mesmo?

Protarco – Exato.

Sócrates – E agora, não precisamos conceder as dores e aos prazeres uma maneira de ser igual à das opiniões?

Protarco – De que jeito?

Sócrates – Afirmando ser possível sentir prazer embora fútil, quem se alegra de qualquer modo, mas, por vezes, também a respeito de coisas que não existem que nem nunca existiram e que, na maioria dos casos, senão mesmo em todos, jamais virão a concretizar-se.

Protarco – Isso também, Sócrates, terá de passar-se exatamente como disseste.

Sócrates – O mesmo raciocínio é válido a respeito do medo, da cólera e das demais paixões de igual tipo, que muitas vezes poderão ser falsas.

Protarco – Perfeitamente.

Sócrates- E então? Haverá outro modo de qualificar como boas ou más as opiniões, a não ser afirmando que são verdadeiras ou falsas?

Protarco – Não há.

Sócrates – O mesmo se passa com os prazeres, segundo penso: é por serem falsos que os consideramos ruins.