Sócrates — Então, não te resolves a dizer a respeito de que o mais forte e mais sábio terá de ficar com maior porção do que os outros? Além de não te manifestares, não admites que te sugira alguma coisa?
Cálicles — Mas, há muito tempo eu venho insistindo nisso mesmo! Para começar, quando me refiro aos melhores, não tenho em mira sapateiros nem cozinheiros, mas os entendidos nos negócios da cidade e que sabem como bem dirigi-los, e que, além de assisados, são corajosos, porque capazes de porem em execução algum plano, sem virem a desfalecer por moleza de alma.
Sócrates — Não reparaste, meu excelente Cálicles, como não é a mesma coisa o que repreendes em mim e o que censuro em ti? Dizes que eu repito sempre o mesmo ponto e me repreendes por isso; mas a teu respeito é justamente do contrário que me queixo, de nunca dizeres as mesmas coisas sobre o mesmo assunto; ora declaras que os melhores e mais poderosos são os mais fortes, ora os mais sensatos; agora, porém, vens com outra novidade, pois afirmas que os corajosos é que são os melhores e mais fortes. Por isso, caro amigo, explica-me de uma vez por todas, quem consideras melhor e mais poderoso, e de que modo se manifesta essa superioridade.
Cálicles — Já o disse: os que entendem dos negócios públicos e são corajosos. A esses é que compete governar as cidades, mandando a justiça que tenham mais do que os outros, os governantes mais do que os governados.