mantiké: adivinhação
1. Embora a terminologia permanecesse fluida, podem com Cícero, De div. I, 11, distinguir-se dois tipos diferentes de comunicação, frequentemente dos acontecimentos futuros, concedidos pelos deuses aos homens: um, a comunicação direta através de um «médium» humano, o prophetes, possesso de um deus, tipicamente Apolo, e daí um porta-voz desse deus. Uma variante disto era a aparição de um deus a um indivíduo num sonho (oneiros). O segundo método, que era menos idiossincrático dado que podia ser aprendido em vez de aparecer como um favor divino mais ou menos fortuito, era a «leitura» de vários fenômenos naturais tais como os hábitos dos pássaros (augúrio), as entranhas de vários animais de sacrifício (haruspicia; para a teoria fisiológica ver oneiros), a fisionomia da palma da mão (quiromancia), o uso de sortes (cleromancia) ou passos arbitrariamente escolhidos de um autor favorecido (confrontar as sortes Vergilianae medievais e as sortes Biblicae).
2. Platão associa o método da comunicação direta através de um médium com uma loucura (mania) divinamente inspirada. Os exemplos que ele cita são os das sacerdotisas e profetas em Dodona e Delfos e a Sibila (Fedro 244b-c). Passa depois a ligar esta «loucura divina» com a do poeta inspirado que é também, em certo sentido, «possesso de um deus», entheos (ibid. 245a), analogia que aparece pela primeira vez na literatura em Demócrito (frgs. 17, 18; ver Apol. 22b: a noção pode ser socrática).
3. O conceito de possessão (enthousiasmos) que fornece a base teorética para as alocuções inspiradas do profeta não é susceptível de definição exata. Os próprios antigos tinham a consciência de que era um estado não-racional (ver Platão, Apologia 22b-c; Ion 536c), e uma época posterior mais sofisticada e curiosa psicologicamente estava bem informada a respeito dos vários (fenômenos psíquicos concernentes ao enthousiasmos (ver Jamblico, De myst. 3, 4-7, 110-112), bem como das possibilidades de uma «cura» homeopática (ver katharsis).
4. A distância entre Platão e Jâmblico é marcada por outra mudança significativa: o declínio dos lugares de oráculo institucionalizados como Delfos e Dodona com a sua mediunidade organizada, e a ascensão dos prophetai individuais que traficavam com uma grande variedade de fenômenos psíquicos e que frequentemente proclamavam poderes miraculosos. Exemplos típicos, v. g. Apolônio de Tiana e a sátira de Alexandre de Luciano pertencem propriamente à história da religião. Mas eles compartilham, juntamente com a escola neoplatônica contemporânea de Jâmblico, a inclinação para o miraculoso e o maravilhoso. Notemos rapidamente que no neoplatonismo as várias espécies de magia eram acompanhadas de uma teoria filosófica bastante elaborada que se baseava pelo menos em parte na noção estoica de simpatia universal ou sympatheia.
5. Esta theourgia neoplatônica ou «trabalho sobre deus» consistia principalmente na manipulação de certos objetos para causar uma presença divina quer numa estátua quer num médium humano (ver Proclo, In Timeu III, 155, 18; Jâmblico, De myst. III, 4-7). De fato, tal união dos poderes divinos tem um fim oracular e a coleção mais famosa de respostas oraculares do mundo antigo, os Oráculos Caldaicos, é continuamente citada na tradição neoplatônica desde Porfírio até Proclo, escrevendo este último a seu respeito um extenso comentário.
A base filosófica da adivinhação é discutida na rubrica sympatheia; a de theourgia, na de dynamis 10-11. [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]