PLATONISMO CRISTÃO? QUE PLATONISMO? Miguel Spinelli
Intróito
O que dizer do Platonismo na medida em que lhe foi sobreposto o adjetivo cristão? Foi a partir do século II, por obra de helenistas convertidos ao Cristianismo, que se deu esse tipo de sobreposição. Ela foi feita sobretudo em função de dois objetivos: um, dar à doutrina cristã um status filosófico; outro, transformá-la numa doutrina plenamente aceita pelos intelectuais (ou seja, helenistas) da época.
Ao recorrer à Filosofia, os novos helenistas convertidos — tais como Justino, Tertuliano, Clemente de Alexadria, Orígenes, Gregório de Nazianzo (objeto de estudo deste artigo) , Basílio e Gregório de Nissa — evidenciaram várias “convergências” entre a doutrina cristã e as doutrinas filosóficas. Foi por causa dessas supostas convergências que eles se viram impulsionados a se adentrar ainda mais no território filosófico. Em geral, eles se serviram bem mais de Platão do que de Aristóteles. A recorrência a Aristóteles se deu sobretudo pelo fato de eles terem encontrado na lógica aristotélica uma porta de acesso para a “teologia” de Platão. Direta ou indiretamente, eles encontraram em Platão e em Aristóteles inúmeras asserções que lhes pareceram úteis. Muitas delas (comumente aceitas na discussão filosófica) foram simplesmente por eles amputadas dos contextos filosóficos originários, e, por vezes, dogmatizadas… O resultado foi uma mescla de Filosofia e de pregação religiosa, cuja tendência foi a de substituir a convicção racional pela fé, a retórica pela autoridade, os princípios racionais pelo dogma, até que o discurso do eclesiástico se transformasse numa fala autoritária… O que se deu, a bem da verdade, foi uma subversão de conceitos, de modo que, o que era tido como Filosofia, pouco a pouco se converteu em Religião…