A mitologia grega, originalmente mitologia que emerge da religião grega, não seria qualquer mitologia, mitologia num conceito demasiado abrangente, mas tão-só aquela que a religião dos gregos podia gerar, e outro tanto se diga da filosofia grega, a qual, como filosofia emergente da religião, não seria qualquer filosofia, pura e simplesmente filosofia, mas só aquela que da religião dos Gregos podia ter nascido. Contudo, acrescente-se que a religião grega também não podia ser qualquer religião, mas aquela somente, que, por natureza sua, tinha de chegar a ser tal, qual efetivamente foi, no fim do seu milenário desenvolvimento – queremos dizer, desnudada de todas as insígnias do sagrado (diria agora: da complementaridade, da imanência e transcendência), uma filosofia saudosa da religião, ou seja, da sua própria origem, como facilmente se verifica nas últimas sobrevivências do pensamento pagão, nomeadamente, nos mais conhecidos representantes do neoplatonismo. (Eudoro de Sousa, “Sempre o Mesmo acerca do Mesmo”)