Vimos More defender contra Descartes a infinitude do mundo e até dizer-lhe que sua própria física necessariamente implica essa infinitude. No entanto, é como se, por vezes, ele se sentisse tomado pela dúvida. Ele está perfeitamente seguro de que o espaço, isto é, a extensão de Deus, é infinito. Por outro lado, o mundo material talvez seja finito. Afinal, quase não há quem não acredite nisso. A infinitude espacial e a eternidade temporal são conceitos rigorosamente paralelos, e ambos parecem absurdos. Além disso, a cosmologia cartesiana pode ser conciliada com um mundo finito. Não poderia Descartes dizer o que aconteceria, nesse caso, se alguém que estivesse sentado na extremidade do mundo atravessasse com a espada a parede que o limita? De um lado, decerto, a coisa parece fácil, pois não haveria lá ninguém capaz de oferecer resistência; de outro lado, parece impossível, uma vez que não haveria nenhum lugar onde a espada pudesse ser atravessada.
A resposta de Descartes a essa segunda carta de More é mais breve, mais seca e menos cordial que à primeira. Sente-se que Descartes está um pouco desapontado com seu correspondente, que evidentemente não compreende a sua grande descoberta, a oposição essencial entre espírito e extensão, e que insiste em atribuir extensão a almas, anjos e até o Deus. Descartes repete:
…. não concebo qualquer extensão de substância em Deus, nos anjos ou em nosso espírito, mas apenas uma extensão de poder, de modo que um anjo pode proporcionar esse poder a uma parte maior ou menor de substância corpórea; pois se não existisse corpo algum, esse poder de Deus ou de um anjo não corresponderia a nenhuma extensão. Atribuir à substância aquilo que só pertence ao poder é efeito do mesmo preconceito que nos leva a supor toda substância, até a do próprio Deus, como uma coisa que pode ser imaginada.