À perplexidade e às objeções de seu admirador inglês Descartes responde — e sua resposta é surpreendentemente moderada e cortês — que é um erro definir a matéria por sua relação com os sentidos, porquanto ao assim procedermos corremos o risco de deixar escapar sua verdadeira essência, que não depende da existência dos homens, e que continuaria a ser a mesma se não houvesse homens no mundo; que, ademais, se dividida em partes suficientemente pequenas, toda matéria torna-se completamente imperceptível aos sentidos; que sua prova da identidade entre extensão e matéria não é de modo algum um sofisma, mas que é tão clara e convincente quanto possível; e que é perfeitamente desnecessário postular uma propriedade especial de impenetrabilidade a fim de definir a matéria, pois a impenetrabilidade é mera consequência da extensão.
Voltando-se então para o conceito de More de extensão imaterial ou espiritual, escreve Descartes:
Não tenho o hábito de discutir palavras, e portanto se alguém quiser dizer que Deus num certo sentido é extenso, porque Ele está em toda parte, não farei objeção. Mas nego que haja em Deus, num Anjo, em nossa alma e em qualquer substância que não seja um corpo, uma verdadeira extensão, tal como todo mundo a concebe. Pois por uma coisa extensa todas as pessoas entendem uma coisa imaginável (quer seja um ens rationis ou uma coisa real), e na qual, pela imaginação, podem-se distinguir partes diversas de uma magnitude e forma determinadas, das quais uma não é a outra; de sorte que é possível, pela imaginação, transferir qualquer uma delas para o lugar de outra, mas não imaginar duas delas no mesmo lugar.