Parm. 146a-147b — O Uno é idêntico e diferente

Como terá de ser igual a si mesmo e diferente de si mesmo, e também, com relação aos outros, igual e diferente, se tudo o que ficou dito se lhe aplica.

Como assim?

Tudo se relaciona com tudo da seguinte maneira: ou há identidade ou há diferença; e quando não há nem identidade nem diferença, terá de haver relação como da parte com o todo ou do todo com a parte.

É evidente.

E o Uno, poderá ser parte de si mesmo?

De jeito nenhum.

Como parte, não poderá ser o todo de si mesmo, o que seria ficar como parte de si mesmo.

Impossível, sem dúvida.

Porventura, será o Uno diferente do Uno?

Absolutamente.

Então, não será também diferente de si mesmo.

Não, de fato.

Não sendo, pois, com relação a si mesmo, nem outro nem tudo nem parte, não terá forçosamente de ser idêntico a si mesmo?

Sem dúvida.

E então? O que está em lugar diferente dele mesmo, enquanto ele próprio se mantém em si mesmo, não terá de ser diferente de si mesmo, visto encontrar-se alhures.

Eu, pelo menos, acho que sim.

Foi deste modo, pois, que o Uno nos revelou: simultaneamente em si mesmo e em outra parte.

Revelou-se realmente.

Neste particular, ao que parece, o Uno teria de ser diferente de si mesmo.

Parece, mesmo.

E então? Se alguma coisa é diferente de outra, não diferirá também dessa coisa que é outra?

Necessariamente.

E não é também verdade que tudo o que não é um terá de ser diferente do Uno, como o Uno é diferente do não-um?

Como não?

Nesse caso, o Uno será diferente dos outros.

Diferente.

Considera agora o seguinte: o mesmo em si e o outro, não são opostos?

Sem dúvida.

E consentiria, porventura, o mesmo em residir no outro, ou o outro, no mesmo?

Nunca.

Logo, se nunca o outro pode estar no mesmo, não há ser no que o outro possa estar durante o tempo que for, porque se se encontrasse durante algum tempo em alguma coisa, todo esse tempo o outro estaria no mesmo. Não é verdade?

Certo.

Logo, se o outro nunca pode estar no mesmo, jamais poderá encontrar-se em nenhum ser.

É evidente.

O outro, por conseguinte, não poderá estar nem no um nem no não-um.

Não, realmente.

Não será, pois, por meio do outro que o Uno se diferencie do que não é um, nem o não-um do que é Uno.

Sem dúvida.

Como não será por eles mesmos nem pelo diferente, de todo o jeito terão de não diferir um do outro.

Sem dúvida.

Mais: Os não-um não participam absolutamente do Uno, pois assim deixariam de ser não-um, para serem, de certo modo, um.

É verdade.

Outrossim, os não-um não poderão ser número, pois não seriam, em absoluto, não-um, se tivesse número.

Com efeito.

E agora: Os não-um serão partes do Uno? Não seria esse o caso de participarem do Uno os não-um?

Seria.

Se este for um, de modo absoluto, e os outros, não-um, nem o Uno será parte dos não-um, nem um todo do qual os não-um seriam parte. Por outro lado, os não-um não serão parte do Uno nem dos todos, dos quais o Uno seria parte.

Não, realmente.

Porém já dissemos que as coisas que não apresentam relação recíproca nem de partes nem de todo nem de diferença, terão de ser idênticas entre si.

Dissemos, realmente.

Afirmaremos, então, que sendo essas as relações do Uno como os não-um, o Uno é idêntico a eles?

Sim.

Logo, ao que parece, o Uno é diferente dos outros e de si mesmo, como é idêntico àqueles e a si mesmo. É a conclusão que talvez precisemos tirar do nosso argumento.