Platão: Eros – relato de Diotima

Excerto de BRISSON, Luc. Platon. Le Banquet. Paris: GF-Flammarion, 2007, p. 142-143
É uma história muito longa, [203b] ela [Diotima] respondeu [a Sócrates]. No entanto, vou contá-la a você. Você deve saber que, no dia em que Afrodite [filha de Zeus e Dione] nasceu, os deuses estavam celebrando; entre eles estava o filho de Metis [primeira esposa de Zeus; metis = astúcia], Poros [passagem (marítima); recurso]. Então, quando o banquete acabou, veio Penia [pobreza], que tinha vindo mendigar como é natural em um dia de festa, e ela estava parada na porta. Poros, que havia se embriagado com o néctar [bebida da imortalidade] porque o vinho ainda não existia naquela época, arrastou-se para o jardim de Zeus e, pesado com a embriaguez, adormeceu lá. Aí Penia, na penúria, teve o projeto de ter um filho feito por Poros; [203c] ela se estendeu perto dele e ficou grávida de Eros. Se Eros se tornou seguidor de Afrodite e seu servo, é porque ele foi gerado durante as festas dadas em homenagem do nascimento da deusa; e se ao mesmo tempo ele é por natureza apaixonado pelo belo, é porque Afrodite é bela.
Logo, sendo filho de Poros e Penia, Eros está na seguinte condição. Em primeiro lugar, ele é/está sempre pobre e está longe de ser delicado e bonito, como a maioria das pessoas acredita. Pelo contrário, ele é rude, bagunceiro, descalço e [203d] não tem morada, dorme sempre no chão e rudemente, dorme sob as estrelas nos degraus das portas e nas margens dos caminhos, porque, desde que descende de sua mãe, é a indigência que dela partilha. A exemplo do pai, por outro lado, está à procura do que é belo e do que é bom, é viril, resoluto, ardente, é um caçador formidável, nunca para de tramar astúcias, é apaixonado pelo conhecimento e fértil em expedientes, passa todo o tempo filosofando, é um feiticeiro formidável, mago e especialista [sofista?]. Deve-se acrescentar que por natureza ele não é imortal [203e] nem mortal. No espaço do mesmo dia, às vezes está em flor, pleno de vida, às vezes está moribundo; então, ele volta à vida quando seus expedientes sucedem em virtude da natureza que ele tem de seu pai; mas o que seus expedientes constantemente obtêm para ele lhe escapa; então Eros não é jamais nem na indigência e nem na opulência.