Imortalidade da Alma

A tendência comum é representar a imortalidade da alma como sua perenidade face a morte do corpo. Entretanto é possível pensar a imortalidade como o permanente sob a impermanência geral. Pensamentos têm início e fim, limites, são passageiros; sensações têm início e fim, limites, são passageiras; percepções têm início e fim, limites, são passageiras. Algo, no entanto, permanece contínuo, justamente sob a passagem dos pensamento, sensações e percepções. Algo não tem início e fim, e limites, junto com os pensamentos, sensações e percepções que passam. Pensamentos, sensações, percepções são EM, COM e DE algo. Eis a imortalidade EM que se dão pensamentos, sensações e percepções; COM que pensamentos, sensações e percepções se dão; DE que pensamentos, sensações e percepções se dão.


O’MEARA, Dominic J.. Plotinus. An Introduction to the Enneads. Oxford: Claredon Press, 1995, p. 14.

Um dos primeiros escritos de Plotino, Eneada-IV-7, devotou-se a demonstração da imortalidade da alma. Platão a defendia no Fédon e no Fedro (245c-e). Platão afirma que a alma é uma realidade incorpórea, não-composta, não sujeita à destruição; o que é contestado por Aristóteles. Para Aristóteles, a alma, como a estrutura (ou “forma“) responsável por várias funções de um corpo vivo, não pode escapar à morte. No entanto uma função vivente, o intelecto, parece ser uma exceção: na visão de Aristóteles o pensamento não é a função de um órgão corporal particular. O intelecto assim parece ter direito à imortalidade (De Anima, 2.2.413b24-7; 3.4-5). Entretanto, Aristóteles é deveras obscuro aqui e de qualquer maneira a questão da imortalidade jaz muito além de interesses primordialmente biológico no De Anima. Os estoicos em geral admitem somente um tipo limitado e impessoal de imortalidade: depois da morte as almas dos sábios podem se unificar com o espírito divino permeando o mundo. Epicuro e seus seguidores, fieis a sua teoria que tudo nada mais é senão uma série de agrupamentos temporários de átomos no vazio, pensa a alma como uma agrupamento de (particularmente finos) átomos, portanto por sua natureza destinada à desintegração. Em Eneada-IV-7, Plotino argumenta pela posição de Platão desaprovando as teorias de Aristóteles, dos estoicos, e de Epicuro e seus seguidores. E este argumento por sua vez tem um efeito no tipo de posição que Plotino acaba defendendo.