Sof 259b-264b: O Não-ser no discurso

Estrangeiro – Quem não acreditar nessas oposições, estude o assunto por conta própria e apresente explicação melhor; e no caso de imaginar que excogitou algo difícil e de encontrar prazer em puxar os argumentos em todos os sentidos, só direi que perdeu tempo com o que nada vale, conforme o demonstrou a presente exposição, pois tudo aquilo nem é engenhoso nem difícil de encontrar. Árduo e nobre é apenas o seguinte.

Teeteto – Que será?

Estrangeiro – O que acabei de dizer: pôr de lado todas essas sutilezas e esforçar-se quanto possível por acompanhar e criticar um por um os argumentos de quem declara que, de certo modo, o outro é o mesmo e o mesmo é o outro, de acordo com sua maneira de encarar o assunto, e o que ele diz com respeito às duas afirmações. Porém asseverar que, de qualquer jeito, o mesmo é outro e o outro é o mesmo, o grande é pequeno e o semelhante dessemelhante, folgando por estadear em seus discursos todas essas oposições, não é verdadeira refutação, porém o balbuciar de algum novato que mal principia a entrar em contacto com o ser.

Teeteto – Sem dúvida nenhuma.

Estrangeiro – Realmente, meu caro, a tentativa de separar tudo de tudo é prova de grosseria e de absoluto alheamento das Musas e da filosofia.

Teeteto – Por quê?

Estrangeiro – O mais radical processo para acabar com qualquer espécie de discurso é isolar cada coisa do seu conjunto, pois o discurso só nos surge pronto pelo entrelaçamento recíproco das partes.

Teeteto – É a pura verdade.

Estrangeiro – Considera agora como foi oportuna nossa campanha contra essa gente, no empenho de forçá-los a permitir que uma coisa se misturasse com outra.

Teeteto – Oportuna, por quê?

Estrangeiro – Por incluirmos nosso discurso no gênero dos seres. Se nos víssemos privados dele, ficaríamos também privados do que há de mais importante, a saber, a própria filosofia. Porém precisamos chegar a uma conclusão sobre o que venha a ser discurso. Se no-lo roubassem, com negar-lhe qualquer espécie de existência, ficaríamos daqui por diante inteiramente incapazes de falar; e roubado nos seria, se chegássemos a admitir que não há o que se misture com outra coisa.

Teeteto – É muito certo tudo isso; porém não compreendo a necessidade de explicarmos o discurso.