(v. Cibele)
Deusa da fertilidade, deusa maternal da terra, Terra-Mãe, cujo culto remonta à mais remota Antiguidade, e se reveste dos maiores mistérios, Deméter ocupa o centro dos mistérios iniciáticos de Elêusis, que celebram o eterno recomeçar, o ciclo das mortes e dos renascimentos, no sentido, provável. de uma espiritualização progressiva da matéria. Ela dá à luz Perséfone, filha única, que foi raptada por Hades, e se tornou rainha dos Infernos. A Antiguidade descreveu em comoventes poemas a aflita viagem de Deméter aos infernos em busca de sua filha perdida. Mãe e filha são representadas na arte como unidas por uma ternura igual. São invocadas juntas no culto, para assegurar a sobrevivência das almas no mundo dos Mortos.
Deméter confiou a Triptólemo, filho do rei de Elêusis, uma espiga de trigo. Triptólemo percorreu o mundo para ensinar aos homens a agricultura. Mas a vegetação está submetida, ela também, à lei das mortes e dos renascimentos: se o grão não morre . . Antes de germinar e de começar a sair da terra, o grão passa meses escondido, como Perséfone, que passou seis meses de inverno no mundo subterrâneo, junto de Hades, antes de voltar para outros seis meses de primavera e de verão ao lado de sua mãe na luz do Olimpo.
Por suas relações com a filha, deusa dos infernos, e com Triptólemo, o propagador da cultura do trigo, Deméter se revela como deusa das alternâncias entre a vida e a morte, que marcam o ritmo das estações, o ciclo da vegetação e de toda existência. Ela participa, por essa forma, do simbolismo da terra-mãe. Mas distingue-se da terra, elemento cosmogônico (Gaia, Reia) no fato de simbolizar a terra cultivada, a que produz o trigo e todas as ricas searas.
Deméter simboliza, com efeito, uma fase capital na organização da terra: a passagem da natureza à cultura, do selvagem ao civilizado. Se intervêm símbolos sexuais no curso da iniciação aos grandes mistérios de Elêusis, é menos para evocar, ao que parece, a fecundidade da união sexual que para garantir ao iniciado uma regeneração num Além de luz e de felicidade. Feliz, entre os homens da terra, aquele que tem a visão destes mistérios (hino homérico a Deméter).
Segundo a interpretação psicanalítica de Paul Diel (DIES, 197), Perséfone seria o símbolo supremo do recalcamento; e o sentido oculto dos mistérios de Elêusis consistiria na descida ao subconsciente a fim de libertar o desejo recalcado (a fim de buscar a verdade sobre si mesmo), o que pode ser a mais sublime das realizações. E Deméter, que deu aos homens o pão, símbolo do alimento espiritual, lhes dará o sentido verídico da vida: a sublimação-espiritualização do desejo terrestre, i.e., a libertação com respeito a toda exaltação como a todo recalque. Deméter se afirma, assim, como o símbolo dos desejos terrestres justificados, que encontram satisfação graças ao esforço engenhoso do intelecto servidor, o qual, cultivando a terra, permanece assim mesmo acessível ao apelo do espírito. E, todavia, Deméter, a fecundadora maternal e espiritual, não se iguala ao espírito como Hera, esposa de Zeus. Ela não é a luz, mas o caminho para a luz, ou o archote que ilumina esse caminho. (DS)