Parm. 157b-159b: Quarta Hipótese: se o Uno é, as outras coisas são parte…

E agora, passaremos a considerar o que ocorre com os outros, no caso de existir o Uno?

Consideremos.

Digamos, então: admitindo-se que o Uno exista, que acontecerá com as coisas que não são o Uno?

Sim, perguntemos isso mesmo.

Visto serem outras que não o Uno, essas outras coisas não serão o Uno, sem o que não seriam outras que não o Uno.

Certo.

Por outro lado, as coisas não poderão estar totalmente privadas do Uno, devendo, de certo modo, participar dele.

De que jeito?

Porque as outras coisas que não o Uno só são outras por serem constituídas de partes; se não tivessem partes, seriam simplesmente um.

Certo.

Porém só há partes, é o que afirmamos, com relação a algum todo.

Sim, afirmemo-lo.

Porém o todo terá, por força, de ser uma unidade de muitas coisas, cujas partes são, precisamente, partes, pois cada parte terá de ser parte não de muitas coisas, mas de um todo.

Como assim?

É o seguinte: se alguma coisa fosse parte de uma pluralidade na qual também ela estivesse incluída, passaria a ser parte de si mesma, o que não é possível, e também de cada uma das outras partes, por sê-lo de todas. Porque, se não fosse parte de uma, sê-lo-ia de todas, com exceção dessa uma, e assim não seria parte de cada uma das partes, e não sendo parte de nenhuma, não o seria de nenhuma das dessas pluralidade. Ora, não sendo de nenhuma, não poderia ser parte ou o que quer que seja de todas essas coisas com as quais ela não tem nenhuma relação.

É evidente.

Assim, a parte não é parte nem da pluralidade nem de todas as suas partes, porém de uma certa ideia ou de certa unidade a que damos o nome de todo, unidade perfeita nascida desse todo. Disso, apenas, é que a parte é parte.

De inteiro acordo.

Se os outros, pois, têm partes, participarão também do todo e do Uno.

Exato.

Por isso, as outras coisas que não o Uno terão necessariamente de ser um todo perfeito, com partes.

Forçosamente.

O mesmo argumento vale para cada parte em separado, que terão forçosamente de participar do Uno. Se cada uma delas é parte, a expressão Cada uma implica unidade, distinta do resto e existente por si mesma, visto ser parte.

Certo.

Mas é obvio que para participar do Uno terá de ser diferente, sem o que não participaria dele: seria o próprio Uno. Porém tirante a própria unidade, nada mais pode ser unidade.

Nunca!

Assim, o todo e as partes terão necessariamente de participar do Uno; aquele seria o todo do qual as partes seriam partes, e cada uma destas, por sua vez, uma parte do todo, parte una e individual desse todo.

Certo.

Porém as coisas que participam do Uno não terão de ser diferentes do Uno de que elas participam?

Como não?

Mas as coisas diferentes do Uno não terão de ser múltiplas, pois se não fossem um nem mais de um, nada seriam.

Nada, realmente.

Por serem mais numerosas do que o Uno, tanto as coisas participam do Um-parte como do Um-todo, não serão forçosamente de número infinito pelo próprio fato de participarem do Uno?

Como assim?

Examinemos o problema do seguinte modo. Não é evidente que no instante preciso em que vão participar do Uno, nem são ainda o Uno, nem dele participam?

Claro.

Logo, terão de ser múltiplas, por ainda não estar nelas o Uno.

Múltiplas, sem dúvida.

E então? E se nos decidíssemos a eliminar mentalmente a menor porção possível de conceber-se, essa partícula assim retirada, visto não participar do Uno não seria forçosamente multiplicidade, não unidade?

Necessariamente.

Assim, insistindo em considerar dessa maneira e em si mesma a natureza estranha à ideia, tudo o que nela viermos a perceber não será de número infinito?

Perfeitamente.

Então, quando cada parte, uma após a outra, se tornou parte, passam todas a apresentar limites tanto entre elas próprias como em relação com o todo, o mesmo acontecendo com o todo em relação às partes.

É muito certo.

Desse modo, a consequência para as outras coisas que não o Uno, quando na companhia do Uno, parece ser a aquisição de algo novo que lhes confere limites em suas relações recíprocas; ma, por sua própria natureza, elas são ilimitadas.

É possível.

Por isso, as coisas outras que não o Uno, como todo e como partes, são infinitas e participam de limite.

Perfeitamente.

E porventura não serão também semelhantes e dissemelhantes, tanto em suas relações recíprocas como com elas mesmas?

De que jeito?

Do seguinte: se por sua própria natureza todas forem ilimitadas, todas apresentam o mesmo caráter.

Perfeitamente.

Por outro lado, pelo próprio fato de todas participarem de limite, todas são afetadas de igual modo.

Sem dúvida.

Mas, por isso mesmo que é da condição de todas serem simultaneamente limitadas e ilimitadas, apresentam caracteres contrários entre si.

Certo.

Porém, todos os contrários são tão dissemelhantes quanto possível.

Como não?

Logo, com respeito a cada um dos caracteres, as outras coisas que não o Uno são semelhantes a ela mesmas e entre si, e em virtude dos dois, inteiramente contrárias e de todo em todo dissemelhantes.

Certo.

Sendo assim, as outras coisas serão ao mesmo tempo semelhantes e dissemelhantes a elas mesmas e entre si.

É possível.

Como serão reciprocamente idênticas e diferentes, em movimento e em repouso, não nos sendo, ademais, difícil demonstrar que as coisas que não o Uno estão sujeitas a todas as afecções contrárias, visto se nos terem revelado como passíveis das mesmas afecções.

Falaste com muito acerto.