Aristóteles: noesis

12. O tratamento que Aristóteles faz da noesis, tal como a sua explicação da aisthesis, é conduzido dentro das categorias da potência (dynamis) e do ato (energeia). O noûs, antes de conhecer, nada é na realidade a não ser potencialmente todas as coisas que é capaz de conhecer: os eide estão presentes nele mas apenas potencialmente (De anima III, 429a). Quando o noûs começa a operar passa de um estado passivo para um ativo em virtude de se tornar idêntico ao seu objeto, a forma inteligível (ibid. III, 431a). Há na noesis um paralelo com a aisthesis: tal como a aisthesis extrai as formas sensíveis (eide) dos objetos sensíveis (ver aisthesis 19), também a noesis pensa as formas inteligíveis em imagens sensíveis (phantasiai), e a noesis nunca ocorre sem estas últimas (ibid. III, 431a-b). A noesis pode ser diretamente das essências (para o papel intuitivo do noûs ver epagoge 3-4 e confrontar Metafísica 1036a), ou pode operar através de juízos (hypolepseis), i. e., pela combinação (synthesis) ou separação (diairesis) de conceitos, e é só nesta última operação que o erro (pseudos) é possível (ibid. 430a-b; para a teoria platônica do juízo, ver doxa 4). Para a operação do noûs cósmico em Aristóteles, cf. noûs, kinoun.

13. Os atomistas consideraram a alma, que estava distribuída por todo o corpo (Aristóteles, De An. I, 409; Lucrécio III, 370), como sendo a sede de todas as sensações (para o mecanismo disto, ver aisthesis 22-23). Mas, dado que a alma (psyche) e o espírito (noûs) são substancialmente o mesmo (De anima I, 404a), parecia dever concluir-se que a sensação e o pensamento são idênticos e assim concluiu Aristóteles (Metafísica 1009b; ver Aécio IV, 8, 5; IV, 8, 10). Quanto à sua operação, visto que o noûs nada mais é do que uma espécie de aglutinação (ver holon 10) dos átomos-alma no peito, é razoável supor que alguns dos eidola penetram para além dos órgãos dos sentidos de superfície, atingem o interior do peito, e assim ocasionam este tipo superior de percepção (ver Lucrécio IV, 722-731).

14. Mas já vimos que os primeiros atomistas tinham tentado distinguir, pela pureza da sua constituição e sua localização, o espírito da alma. Os epicuristas mantiveram e aperfeiçoaram a distinção e esta está especialmente presente na aplicação consistente que Lucrécio faz da anima para psyche e animus para noûs ou dianoia (mens é um pouco estreita de mais na conotação da última dado que o animus é a sede da atividade volitiva bem como intelectual; III, 145). Separa nitidamente as duas em III, 396-416 onde argumenta que parte da anima pode ser perdida (v. g., na perda de um membro) e um homem pode ainda sobreviver, mas a perda do animus significa o fim instantâneo do organismo.

,