Tradução em português de José Carlos Baracat Júnior
4. Devemos investigar a chamada parte afectiva da alma. De certo modo, já falamos dela lá onde, a propósito de todas as afecções que se originam nas partes irascível e desiderativa, explicávamos como é cada uma; entretanto, ainda é preciso falando sobre ela, considerando, em primeiro lugar, o que dizemos ser a parte afectiva da alma. Com efeito, diz-se que, universalmente, é aquilo onde as afecções parecem constituir-se; e são afecções as que são seguidas por prazeres ou tristezas. Dentre as afecções, algumas se constituem com as opiniões, como quando alguém sente medo porque tem a opinião de que estar em iminência de morrer, ou se compraz pensando que algo bom lhe ocorrerá: a opinião está em uma parte e a afecção se moveu em outra; mas outras afecções são tais que, regendo involuntariamente por si mesmas, produzem a opinião na faculdade que é opinativa por natureza. Foi dito que a opinião deixa inalterada a parte opinativa; e que o medo resultante da opinião, provindo por sua vez de cima, da opinião, proporciona como que uma consciência à parte da alma que se diz que teme.
Então, que produz esse temor? Desconserto e choque, dizem, ante um mal pressentido. Portanto, deveria ser assim evidente que a imaginação está na alma, tanto a primeira, que chamamos opinião, quanto a que dela provém e já não é opinião, mas como que uma opinião turvada e uma imaginação indistinta surgida na parte inferior, similar à atividade inerente à chamada natureza, tendo em conta que esta produz todas as coisas, como dizem, sem imaginação. O que resulta delas é já o desconserto sensível surgido no corpo, o abalo e o tremor do corpo, a palidez e a impossibilidade de falar. Certamente, esses efeitos não surgem na parte anímica: se não, diríamos que ela é corpórea, e, se fosse ela mesma quem sofresse tais efeitos, eles sequer chegariam ao corpo, pois o transmissor não poderia efetuar a transmissão porque estaria possuído pela afecção e se deslocaria de si mesmo.
No entanto, essa parte da alma, a afectiva, existe, e não é um corpo, mas uma forma. Na matéria, porém, não está apenas a faculdade desiderativa, mas também a de nutrição, crescimento e geração, que é raiz e princípio da forma desiderativa e afectiva. Em nenhuma forma deve estar presente um desconserto ou uma afecção em geral, mas a forma mesma deve permanecer imutável, ao passo que a matéria dessa forma deve ser afectada, quando quer que aconteça, enquanto a forma a move por sua presença. Pois não é precisamente a faculdade vegetativa a que vegeta quando faz vegetar, nem a que cresce quando faz crescer, e, em geral, não é ela a que, quando move, se move com aquele movimento com o qual move, mas ou não se move em absoluto ou se trata de um tipo distinto de movimento, ou seja, de atividade. Assim, a natureza mesma da forma deve ser atividade e deve produzir por sua presença, como se a harmonia movesse as cordas por si mesma. Portanto, a parte afectiva será causa de afecção, seja porque a afecção provém dela sob o movimento da imaginação sensível, seja sem a imaginação; e devemos investigar isso, para sabermos se é a opinião provinda de cima quem inicia; mas a parte afectiva mesma permanece, como uma harmonia. As causas do movimento são análogas ao músico; mas as partes golpeadas pela afecção seriam comparáveis às cordas. Pois mesmo lá, a afectada não é a harmonia, mas a corda; no entanto, a corda não se moveria, ainda que o músico quisesse, se não o ditasse a harmonia.