Constitui uma parte muito importante da doutrina, porque não encontramos apenas uma tentativa de descrever a fisiologia dos organismos, e em particular a dos órgãos dos sentidos, mas descobrimos, sobretudo, as primeiras expressões de uma teoria do conhecimento e o remate da visão dramática do mundo, a que preside a luta do Amor e do Ódio.
Não podemos entrar aqui nos pormenores, mas digamos que Empédocles atribui grande importância ao fenômeno da respiração, que descreve com minúcia. Vê na respiração cutânea um efeito do vazio parcial, provocado pelos movimentos do sangue que se retira para os órgãos interiores e desencadeia uma necessidade de ar. É esta alternância dos movimentos do sangue que provoca as alternâncias de inspiração e expiração pela traqueia ou pelos poros da pele. A respiração é, portanto, o ato elementar que, pelos seus ritmos, mantém a vida, permite a compenetração do interior e do exterior e a união do que somos a tudo o que nos rodeia. Encontramos ainda aqui o tema da mistura e da luta, na imagem do sangue e do ar que mutuamente se perseguem.
A descrição do funcionamento dos órgãos dos sentidos prende-se com um grande princípio da visão do mundo de Empédocles, segundo o qual «o semelhante conhece o semelhante». Sabe-se que, para Heráclito, a natureza ama os contrários e reúne-se no seio de tensões opostas, como as que são inerentes ao arco ou à lira. Em seu entender, a natureza não se interessa pelos semelhantes (fgt. 10). Em Empédocles encontramos, ao contrário, uma teoria da simpatia, mais ou menos herdada dos Eleatas, segundo a qual o semelhante conhece o semelhante (to gar homoion tou homoiou ephiesthai) porque é por ele atraído. Esta afirmação não deve confundir-se com a teoria segundo a qual o Amor reúne todas as coisas. O Amor, esse une o dissemelhante ao dissemelhante, por isso se diz que é «envolvente» (fgt. 19). Como conciliar a ideia de que «o semelhante conhece o semelhante» com a de que o Amor une os contrários?
Sabemos que, no Sphairos primitivo, o Amor mantinha a coesão dos quatro elementos e que o Ódio, quando prevalece, divide e impede a atração dos dissemelhantes. Mas todos os indivíduos se compõem das quatro raízes elementares e diferem uns dos outros apenas pelo número ou as proporções das raízes que presidem à sua constituição. É pela semelhança das raízes que os compõem que os indivíduos tendem uns para os outros e se desejam. O conhecimento do semelhante pelo semelhante é, por assim dizer, a razão pela qual um resto de unidade se opõe ao Ódio que dissocia todas as coisas. É, efetivamente, no âmago das diferenças individuais que brota o desejo que impele os seres uns para os outros, apesar e através de todas as diferenças que deveriam mantê-los para sempre afastados uns dos outros. A atração do semelhante pelo semelhante é o laço que triunfa de qualquer espécie de ruptura.
No entanto, parece que se pode falar de uma espécie de manha do Ódio, que se serve da atração do semelhante pelo semelhante. Com efeito, na terceira fase da cosmogonia, de que já falamos, consegue, utilizando a atração do semelhante pelo semelhante, dissociar o próprio indivíduo e reduzir o mundo a quatro esferas elementares que se comportam como estranhas entre si. Depois disso, nada mais tem a dividir e encontra-se, por assim dizer, vencido pela sua própria vitória. Toma-se necessário que o Amor intervenha imediatamente para recomeçar a associação dos elementos.
A ideia de que o semelhante é atraído pelo semelhante comanda toda a teoria empedocleana da percepção. Para Empédocles «a percepção provém das emanações apropriadas aos poros de cada sentido» (31 A 86). Os corpos emitem eflúvios que são como que outras tantas partículas minúsculas que deles se separam, penetram pelos poros de cada órgão dos sentidos, que têm todos diâmetros diferentes, conforme os órgãos a que pertencem, o que faz com que seja impossível que um sentido perceba o que se destina a outro. A sensação é, pois, como uma respiração pela qual se compenetram o que percebe e o percebido. Permite ao homem entrar em comunicação, mesmo em comunhão, com o que o rodeia:
Assim o doce se apercebe do doce, o amargo se precipita para o amargo,
O ácido para o ácido e o quente se une ao quente, (fgt. 90)
O homem recebe mensagens do universo, porque ele próprio é um microcosmos em que se encontram as quatro raízes do universo:
Vemos a terra através da terra, a água através da água,
O ar divino através do ar e o fogo destruidor através do fogo,
A afeição através da afeição, o ódio através do ódio funesto, (fgt. 119)
0 homem vê, quando o fogo que em si traz se une ao do universo; ouve, quando, por uma espécie de fenômeno de eco, o ar movido pela voz ressoa no interior da orelha; sente, quando as partículas, de que estão carregados os eflúvios, encontram partículas semelhantes no interior do seu corpo. Por isso, pela percepção, que permite ao semelhante conhecer o semelhante, o homem simboliza com o universo.
Compreendemos então que o pensamento esteja muito próximo da percepção. O sangue, que é composto de água, ar, terra e fogo, é o órgão do pensamento. É portanto com a ajuda do elemento existente no nosso corpo que sentimos e pensamos os elementos do mundo que nos rodeia. Pelo sangue que engendra o pensamento, o homem participa do universo numa verdadeira conaturalidade cósmica. Como nos ensina Teofrasto, referindo-nos as ideias de Empédocles sobre este assunto : «O pensamento nasce do que é semelhante, a ignorância, do que é dissemelhante, se bem que o pensamento seja a mesma coisa, ou quase, que a sensação. Com efeito, depois de ter enumerado as maneiras como conhecemos cada coisa por meio dela própria, diz:
Deles [os elementos] todas as coisas foram ajustadas e constituídas
É por eles que os homens pensam e encontram prazer e dor. (fgt. 107)
É por isso que pensamos sobretudo com o nosso sangue, porque é nele que os elementos das partes do corpo estão mais misturados.» (31 A 86)