Descida pelos cinco degraus pelos quais se fez a ascensão… (Ficino, TP)

A função da unidade em si e do repouso é tão poderosa que parece ser superada pelos opostos apenas no nível mais baixo do universo. E, no entanto, mesmo aí, por vezes prevalece de alguma forma, porque mantém sempre a unidade de substância e ordem na matéria, que por si só está sujeita a uma multiplicidade e modificação infinitas. Deus é de fato unidade, como já provamos. É também imóvel, pois não é movido nem por outrem, já que nada é mais poderoso do que ele, nem por si mesmo, pois não pode ser transformado em algo melhor, já que é bom por excelência. Por outro lado, nada se transforma, por si só, em algo pior. Mas se dissermos que Deus passa de um estado a outro, perguntaremos se ele obtém algo novo ou nada. Se não obtém nada de novo, não mudou realmente. Se obtém algo de novo, então não tinha tudo antes. Um ser que não possui tudo não é Deus. Porque Deus está em todo o lado, não muda de lugar. Porque é o fim de todas as coisas, não se move em direção a outra coisa. Porque é muito simples, é também imóvel dentro de si mesmo, pois se se mover dentro de si mesmo, ou aproximará uma parte de si mesmo da outra, ou pelo menos unirá dentro de si o novo com o velho. De fato, ele voltará a ser substancialmente o que era antes, mas assumirá também uma nova forma e deixará de poder ser absolutamente simples. Finalmente, Deus é a unidade por excelência. Ora, a unidade é o fundamento da estabilidade, porque, tal como o movimento progride para a multiplicidade, a estabilidade assenta na unidade. De fato, em qualquer natureza, chama-se estável aquilo que possui uma única maneira de ser de tal modo constante que não se desvia da unidade da sua natureza. Como poderíamos dizer que a base de toda a estabilidade é mutável? Podemos, aliás, confirmar estas razões através do argumento do pitagórico Numenius: tudo o que muda em relação ao passado e ao futuro, diz ele, inclui uma espécie de privação; de fato, ainda não é o futuro e já não é o passado. Mas em Deus, que é o primeiro ser e o ato por excelência, não há privação. Ele é, portanto, imutável.

Também o anjo é imóvel, porque, sem intermediário e por si mesmo, retira o bem de Deus, fonte de todo o bem, enche-se dele num único momento da eternidade e permanece sempre cheio de bem. Mas como todo efeito, produzido fora de sua causa, conserva algo de sua causa, ao mesmo tempo em que se torna inferior a ela, o anjo, criatura próxima de Deus, conserva algo de Deus e também perde algo de Deus. Mas Deus possui unidade e estabilidade. O anjo não pode conservar ambas: seria o próprio Deus e não um anjo. Nem perde ambas, de modo que a criatura mais próxima e primeira de Deus não se torna muito diferente do seu criador. O que é que acontece então? Mantém apenas a imitação ou a estabilidade? Não pode manter a unidade sem estabilidade, porque a unidade é absolutamente imóvel. Portanto, manterá a estabilidade, mas afastar-se-á da unidade total, o que significa que o anjo é uma multiplicidade imóvel. E não é sem razão que atribuímos multiplicidade ao anjo, pois se ele fosse uma unidade perfeita e absoluta, teria um poder soberano e ilimitado, porque o poder está na unidade. Mas só Deus é um poder ilimitado.