Enéada I, 6, 6: A purificação da alma

Tradução para o português de Américo Sommerman
Retirado de “Do Belo, tratado de Plotino

6. Pois, conforme um antigo ensinamento , a disciplina moral, a coragem e todas as virtude são purificações, inclusive a sabedoria. Por isso os mistérios dizem com razão que o ser que não foi purificado será mergulhado na imundície quando for para o Hades, posto que o impuro, devido aos seus vícios, ama as imundícies, como os porcos, cujos corpos são impuros, amam a impureza.

Em que consistirá então a verdadeira disciplina moral a não ser em não se unir aos prazeres dos corpos, mas fugir deles visto que são impuros e indignos dos puros? A coragem, por sua vez, consiste em não temer a morte. Ora, a morte é a separação entre a alma e o corpo, e o homem que ama estar livre em relação ao corpo não temerá essa separação. Já a grandeza de alma é o desprezo das coisas daqui de baixo. A sabedoria é o ato da inteligência que se desvia das coisas de baixo e conduz a alma para as do alto. Assim, a alma uma vez purificada, torna-se uma Forma [Ideia] e uma razão: torna-se totalmente incorporal, intelectual e pertence inteira ao mundo divino, no qual está a origem da beleza e do qual provém todas as coisas belas. Portanto, uma alma elevada ao nível da inteligência é ainda mais bela, pois a inteligência e o que dela provém são, para a alma, uma beleza própria e não estrangeira, pois só então a alma é realmente uma alma. Por isso se diz com razão que quando a alma se torna algo bom e belo tornar-se semelhante a Deus, pois de Deus provêm toda a beleza e todo o bem que há nos seres.

Podemos inclusive dizer que beleza é a existência real ou a verdadeira realidade e a feiura é o princípio contrário à existência. A feiura é o primeiro mal. Assim, para Deus as qualidades da bondade e da beleza são a mesma, bem como as realidades do Bem e da Beleza. Portanto, devemos seguir o mesmo método para descobrirmos a beleza e o bem, e a feiura e mal.

A Beleza, essa Beleza que também é o Bem, deve ser colocada como a primeira realidade. Imediatamente depois dela vem a Inteligência, que é uma manifestação proeminente da beleza. A alma é bela mediante a inteligência. As outras belezas, por exemplo as das ações e ocupações, provêm do fato de a alma imprimir nelas a sua forma, a qual também é responsável por toda a beleza que há no mundo sensível, pois sendo um ente divino, um fragmento da beleza primordial, torna belas todas as coisas que toca e domina, contanto que ela mesma participe da beleza.