Enéada VI,8,6 — Prosseguimento da interrogação sobre a relação virtude-liberdade

Capítulo 6: Prosseguimento da interrogação sobre a relação virtude-liberdade; caracterização da liberdade ao nível do Intelecto.
1-26: Só a virtude identificada à intelecção é plenamente livre e soberana
26-45: É a vontade do Bem que torna livre o Intelecto

6. Em qual sentido então, nisto que precede, relacionamos o que depende de nós à vontade em afirmando «é o que deve acontecer como o vimos»? E adicionamos no mesmo lugar: «ou não acontecer». Se consequentemente o que se afirma atualmente é exato, e se o que se disse anteriormente deve estar de acordo com estas afirmações, sustentaremos que a virtude e o intelecto são soberanos e que é a eles de se deve relacionar o que depende de nós e a liberdade. Pois estas faculdades não têm mestre: o intelecto depende dele mesmo, e a virtude deseja não depender senão dela mesma em dominando a alma a fim de torná-la boa, e nesta medida a virtude é ela mesma livre e torna a alma livre. Por outro lado, quando surgem paixões e ações impostas pela necessidade, a virtude, em exercendo seu domínio, não quis que elas acontecessem, e no entanto, mesmo nesta situação, ela preserva o que depende dela em o fazendo restabelecer nela mesma, mesmo aqui em baixo: ela não se deixa levar pelas circunstâncias, por exemplo quando se trata de salvar um indivíduo que está em perigo; mas se isso lhe parece bom, ela sacrificará este indivíduo e lhe forçará a sacrificar seu bens, seus filhos e sua pátria mesmo, em tendo em vista sua própria beleza, e não a existência das realidades que lhe são inferiores. Consequentemente, mesmo nas ações, a livre disposição de si e o que depende de nós não devem ser reportados à realização de uma ação, assim como ao ato externo, mas ao ato interior, quer dizer à intelecção e à contemplação próprias à virtude ela mesma. Por conseguinte, deve-se dizer desta virtude que ela é um certo intelecto, em não contando entre as virtudes as afecções que são submissas à razão ou que são medidas por ela, pois estas últimas, como o afirma Platão, parecem «se aproximar do corpo» sendo ao mesmo tempo «corrigidas pelos hábitos e os exercícios». Doravante é mais claro que o que é imaterial é o que é livre, e que é a isso que se deve reportar o que depende de nós; e esta realidade imaterial é a vontade ela mesma, aquela que é soberana e que está nela mesma, mesmo se, de toda necessidade, ela exerce autoridade sobre o que é exterior. Consequentemente, tudo o que deriva desta vontade e que se encontra realizado graças a ela depende de nós, tanto o que é exterior quanto o que está nela mesma. O que quer a vontade e o ato que ela realiza sem encontrar obstáculo, é isso que depende de nós em primeiro lugar. Deste fato, o intelecto contemplativo, quer dizer o primeiro Intelecto, depende dele mesmo desta maneira, posto que seu ato não depende de maneira alguma de um outro, mas é inteiramente voltado para ele mesmo, seu ato é ele mesmo, e reside no Bem, desfrutando de uma existência plena e sem necessidade, e vivendo, se se pode dizer, conforme a sua vontade. Sua vontade, com efeito, é sua intelecção; se a nomeou vontade porque e;a é conforme ao intelecto. Pois o que se chama vontade imita o que é conforme ao intelecto. De fato, a vontade busca o Bem, enquanto pensar é o ser verdadeiramente no Bem. O Intelecto possui portanto o que busca sua vontade, e é em encontrando este objeto que a vontade se torna intelecção. Consequentemente, se situamos o que depende de nós na vontade do Bem, o que já está estabelecido nisto que sua vontade quer ser, como isso não teria a capacidade de depender de si? Ou então, é preciso dar ao intelecto uma posição superior, se se prefere não elevar a este nível a capacidade de depender de si.