Ferreira dos Santos: Introdução ao tratado «Da Geração e da Corrupção»

INTRODUÇÃO

A visão não apanha o movimento, mas sim uma forma em movimento.

Não é o movimento algo primário e original, mas um resultado.

Também é um resultado o dimensional, e tudo o que é dimensional implica movimento.

Todo o resultado é uma transitividade, porque transita do que era antes da operação, para o que é após a operação.

Também todo movimento é transitividade.

Em todo movimento há a atualização de uma possibilidade, e como o ato é a perfeição da potência, em cada momento de transitividade há sempre um ultrapassar.

O movimento é uma modal da ação transitiva. Esta revela a perfectibilização da potência: o ato, que revela a passagem de um modo de ser para outro, que é uma nova qualificação do ser, que passa de um modo para outro.

Se o reduzirmos à filosofia, podemos dizer, seguindo a posição de Suarez, que o movimento é uma modal. O movimento, deste corpo é algo que é distinto dele, mas que é absolutamente inseparável dele. O estudo das modais, que cabe à Ontologia, mostra-nos que o movimento e a dimensão são apenas modais, modalidades das coisas.

A formação do esquema da dimensão é importante para a compreensão de muitos aspectos do movimento. A disposição das partes em ordem a um todo, permitiu ao homem captar o seu nexo. Se estudarmos etimologicamente o conceito de dimensão, alcançaremos a sua raiz, o qual é aposterioristicamente construído pelo homem (post rem), fundado na sua experiência. Nessa dimensio ou demensio do latim, há sempre o apontar da ação da mente (mens, mentis, mensura, e por consequência, medida, captação pensamental do ato de pensar ao comparar pensamentos uns com os outros).

Esse de aumentativo, reforçador, revela-nos que a mente, que atua sempre por acomodação dos esquemas aos fatos do mundo exterior ou aos pensamentos, realiza a assimilação pela “assemelhação” do intencionalmente captado com o esquema, também intencional.

Formado o esquema de ordem, e a captação da relação das partes com um todo, facilmente se é levado ao serial e à formação do conceito de dimensão, que já é sensivelmente construído pela ordenação das coisas no mundo exterior.

Dessa forma, vê-se, apesar de tratado em linhas gerais, que cabe à Noologia estudar, que a dimensão implica a medida (mensura) e a ação da mente em comparar pensamentos captados com pensamentos estruturados em esquemas abstrato-noéticos. Daí, termos as dimensões tópicas (essa dimensão que se estende localiter, a mensura externa, volumen, que é revelada pela ubiquação das coisas do mundo exterior, comparadas, postas de par em par) e que fundam os esquemas das três dimensões do espaço, captadas pelo sensório-motriz e estruturadas em esquemas abstrato-noéticos pela mente (abstração do quantitativo).

E há outras dimensões, como as qualitativas, as axiológicas e as tensionais, que surgem como esquemas abstrato-noéticos da comparação das medidas qualitativas pela comparação dos aspectos qualitativos. Estamos, aqui, em plena dimensionalidade qualitativa, dimensões extrínsecas às espaciais, às do volume, meramente extensistas. As qualitativas são intensistas, pois nelas predominam os graus, já tantas vezes estudados por nós.

As dimensões, vê-se desde logo, implicam a ordem das partes com o todo, a comparação, e são modalidades das coisas. As dimensões do espaço são modais dos corpos, inseparáveis desses, mas metafisicamente separáveis pela construção dos esquemas noéticos que lhes correspondem, sem que lhes caiba um conteúdo fático, subsistente de per si, isto é, com perseidade. Não se dá a profundidade como tal, com um ser subsistente de per si, mas a profundidade em função de esta ou aquela coisa, sem delas se separar em absoluto.

Este é o caráter modal da dimensão das coisas exteriores, (as quantitativas). E como modal também o é a dimensão não tópica, as qualitativas. Para justificar a nossa tese, que em muito nos auxiliará a obter a melhor compreensão do texto aristotélico, examinemos previamente as medidas.

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