XIII – Sócrates – Muito bem. E o terceiro resultado da mistura desses dois, que ideia lhe atribuiremos?
Protarco – Espero que também me expliques esse ponto.
Sócrates – Não; um dos deuses o fará, sem dúvida, se algum deles atender às minhas súplicas.
Protarco – Suplica, então, e reflete.
Sócrates – Já refleti; e quer parecer-me, Protarco, que agora mesmo uma divindade se nos revelou propícia.
Protarco – Em que te baseias, para falares desse modo?
Sócrates – Di-lo-ei dentro de pouco; acompanha meu raciocínio.
Protarco – Podes falar.
Sócrates – Neste momento referimo-nos ao mais quente e ao mais frio. Não foi isso?
Protarco – Exato.
Sócrates – Acrescenta-lhes, também o mais seco e o mais úmido, o mais e o menos, o mais rápido e o mais lento, o maior e o menor e tudo o mais que há instantes incluímos numa só classe definida pelos conceitos do mais e do menos.
Protarco – Referes-te à classe do infinito?
Sócrates – Exato. Agora mistura-a com a família do finito.
Protarco – Que família?
Sócrates – A do finito, que há pouquinho deveríamos ter reduzido à unidade, tal como fizemos com a do infinito, mas deixamos de fazê-lo. Talvez o consigamos agora, se da reunião das duas surgir a que procuramos.
Protarco – A que classe te referes e como será isso?
Sócrates – A do igual e do duplo e toda classe que põe termo à diferença natural dos contrários e enseja harmonia e proporção entre seus elementos, com lhes impor número.
Protarco – Compreendo. Ao que pareces, queres dizer que de cada mistura desses elementos nascem certas gerações.
Sócrates – É justamente o que eu penso.
Protarco – Então, continua.
Sócrates – Não será o caso das doenças, em que a mistura acertada desses elementos produz a saúde.
Protarco – Perfeitamente.
Sócrates – E no agudo e no grave, no veloz e no lento, todos eles infinitos, não se dará a mesma coisa: com deixar limitados esses elementos não darão forma perfeita a toda a música.
Protarco – Sem dúvida.
Sócrates – E com se associarem ao calor, ao frio, não lhes tira o excesso e o infinito, substituindo-os por medida e proporção?
Protarco – Como não?
Sócrates – Essa é a origem das estações e de tudo o que há de belo: a mistura do limitado com o ilimitado.
Protarco – Sem dúvida.
Sócrates – Deixo de mencionar um milhão mais de coisas, tal como a beleza e força com saúde, e também na alma, uma infinidade de qualidades excelentes. Vendo a divindade, meu caro Filebo, a arrogância e toda sorte de maldades que se originam do fato de carecerem de limites os prazeres e a gula, estabeleceu a lei e a ordem, dotadas de limite. Pretendes que ela estraga a alma; pois eu digo justamente o contrário: é o que a conserva. E tu, Protarco, como te parece?
Protarco – De inteiro acordo contigo, Sócrates.
Sócrates – Se bem observaste, aí estão as três classes a que me referi.
Protarco – Parece que compreendi. Uma delas, creio, classificas como infinita; a Segunda; como o limite das coisas existentes; porém não aprendi muito bem o que entendes pela terceira.
Sócrates – O que te deixa perplexo, meu admirável amigo, é a multidão das coisas que ela abarca. No entanto, o infinito também apresenta muitos gêneros; mas, por trazerem todos eles o selo do mais e do menos, parecem formar apenas um.
Protarco – É verdade.
Sócrates – Quanto ao finito, não somente não contém muitas espécies, como não sentimos dificuldade alguma em admitir que constitua uma unidade natural.
Protarco – Sem dúvida.
Sócrates – É assim mesmo. Com respeito ao terceiro, bastará aceitares que eu incluo nessa rubrica, como unidade, todos os produtos dos dois primeiros, tudo o que nasce para o ser, por efeito da medida e do limite.
Protarco – Compreendo.