XXI – Sócrates – Seguindo a ordem natural, depois dos prazeres mistos, certa necessidade nos leva a estudar os prazeres se mistura.
Protarco – Muito bem dito.
Sócrates – Voltar-me-ei, então, para estes, com o propósito de no-los apresentar. Pois não participo, em absoluto, da opinião dos que afirma que todo prazer nada mais é que ausência de dor. Conforme declarei, invoco o testemunho deles mesmos, em como há prazeres que parecem reais, mas que de forma alguma existem, enquanto muitos outros nos parecem grandes, porém de fato não passam de certa mistura de sofrimento e cessação de dores, nas mais violentas crises do corpo e da alma.
Protarco – E que prazeres, Sócrates, terá de aceitar como reais quem estudar como deve essa questão?
Sócrates – Os que se relacionam como as belas cores e as formas e a maioria dos odores e dos sons, e todas as coisas cuja privação não é sensível nem dolorosa, mas de fruição agradável e estreme de qualquer sofrimento.
Protarco – Como devemos entender tudo isso, Sócrates?
Sócrates – Reconheço que assim, de início, meu pensamento não é fácil de entender; mas tentarei explicar-me melhor. Quando falo em beleza das formas, não pretendo sugerir o que a maioria das pessoas entende por essa palavra: animais ou certas pinturas. Refiro-me – é o que declara nosso argumento – à linha reta, ao círculo, e às figuras planas e sólidas formadas de linhas e círculos, ou seja no torno ou com réguas e esquadros, se é que me compreendes. O que eu digo, é que essas figuras não são belas como as demais, em relação a outra coisa, mas são sempre belas naturalmente e por si mesmas e nos proporcionam prazeres específicos, que nada têm de comum com o prazer provocado pelo ato de coçar. Outrossim, são belas as cores e nos proporcionam prazeres da mesma natureza. Compreendemos, afinal, ou como será?
Protarco – De meu lado, esforço-me por entender, Sócrates; mas procura também explicar-te com mais clareza.
Sócrates – Digo, pois, que os sons suaves e claros sempre que formam uma melodia pura são belos por si mesmos, não relativamente a qualquer outra coisa, tal como o prazer que nos enseja sua própria natureza.
Protarco – Há, realmente, prazeres desse tipo.
Sócrates – O prazer dos odores é de um gênero menos divino que os precedentes; mas, por não serem necessariamente associados a nenhum sofrimento, onde e quando se manifestem, classifico-os, em tese, ao lado dos primeiros, para concluir, se é que me faço compreender, que há duas espécies de prazer.
Protarco – Compreendi.
Sócrates – E o seguinte: quando alguém está cheio de conhecimentos e ulteriormente os perde, por havê-los esquecido, percebes alguma dor em semelhante fato?
Protarco – Não, pelo menos por sua natureza; mas, ao refletir sobre o caso, alguém poderá aborrecer-se com essa perda d conhecimento.
Sócrates – Mas, caro amigo, presentemente só nos ocupamos com a natureza desses estados, sem levar em consideração o que possamos pensar a seu respeito.
Protarco – Então, estás certo quando dizes que não é absolutamente dolorosa a perda, por esquecimento, do que aprendêramos antes.
Sócrates – Consequentemente, teremos de concluir que os prazeres do conhecimento são isentos de dor, sobre não serem acessíveis à maioria dos homens, mas a muito pouca gente.
Protarco – É a conclusão que se impõe.