Festugière — Hermetismo e Mística Pagã — Quadro da Mística Helenística
a. Esta graça divina manifesta-se em primeiro lugar na ordem do conhecimento. Uma vez que a razão humana é incapaz de alcançar Deus, Deus só será conhecido se revelar-se. O conhecimento de Deus sai portanto aqui do plano lógico ou intelectual e de uma mística que, indo além deste plano, o prolonga sobre uma mesma linha, para entrar no domínio da gnose (essencialmente gnosis neou), que é un conhecimento de fé: crê-se na revelação ou recusa-se de nela crer.
b. A graça divina manifesta-se em segundo lugar na ordem da ação. Aqueles que creram nele, Deus os protege durante suas vidas, em lhes concedendo um daimon paredros, em lhes ajudando a bem agir.
c. Ela se manifesta em fim, e é seu benefício maior, na ordem dos fins últimos. Uma vez morto, o crente fiel remonta em direção a Deus Salvador, atravessa todo o espaço do mundo abaixo e acima da lua para atingir, na região hipercósmica, o Deus escondido.
Assim se constitui um povo de eleitos, de convocados. Eles receberam a verdade, nela creram, e desde então se distinguem absolutamente da massa. Mas o dom que lhes foi feito impõe-lhes em retorno deveres. A revelação é um segredo (musterion) que eles não devem divulgar (publicare, diaballein ) ou só podem transmitir aos dignos.
Nas místicas consideradas mais adiante, mística do Ser, contemplação dos astros, união à Razão imanente ao cosmos, é um movimento de conhecimento que leva à adoração: colit qui nouit. As vias da negação, do êxtase (plotiniano) ou da analogia são todas, segundo seus próprios modos, métodos teoréticos de união a deus. Nas místicas da salvação, este processo é revertido. Como estes místicos se fundam sobre um sentimento pessimista das possibilidades do intelecto humano, não é possível o conhecimento intelectual conduzir à união divina, a gnosis neou deriva ao contrário da experiência religiosa que toma frequentemente a forma de uma visão. Deixou-se o plano da sabedoria filosófica. Conhecer Deus é doravante affaire de iniciação, de teurgia ou de magia: nouit qui colit.