A influência que a filosofia de Aristóteles exerceu no mundo é algo extraordinário, algo formidável. Toda a antiguidade depois dele apossa-se da magnífica enciclopédia científica que constituem suas obras. Sua Metafísica, sua filosofia primeira, constitui também desde então a base do pensamento filosófico para todo o mundo, seja para aceitálo e desenvolvê-lo, seja às vezes para se opor a ele; porém sempre a oposição supõe uma aceitação, ainda que seja para combater.
Os árabes redescobriram Aristóteles e o transmitiram à filosofia escolástica. Santo Tomás desenvolve a filosofia de Aristóteles na forma mais monumental e perfeita que se conheceu no Ocidente. A partir de então não cessa de imperar nas escolas a filosofia de Aristóteles.
Na Renascença sofre um eclipse a influência da filosofia aristotélica. Novos conceitos, novas instituições, novas aspirações do saber humano se fazem valer nessa época. Porém e apesar de tudo. a influência de Aristóteles, embora diminuída, não cessa por completo. Encontramo-la muito viva, muito profunda, em Leibniz; encontramo-la profundíssima, vivíssima, em Hegel, que às vezes chega a empregar a mesma terminologia que Aristóteles. Encontramo-la, por último, em nossos dias às vezes declarada, às vezes também existente embora não declarada. Assim, por exemplo, para não citar mais que dois elementos atuais da filosofia contemporânea, a técnica filosófica daqueles que têm técnica filosófica (essa mestria para analisar conceitos finamente, para estabelecer distinções, para conduzir as distinções certeiramente à finalidade que se persegue), essa técnica do trabalho filosófico pessoal não se adquire senão em contacto profundo com a filosofia de Aristóteles. Não há nada mais educativo que se aprofundar nos textos de Aristóteles, que são de uma dificuldade extraordinária, não porque Aristóteles seja obscuro, mas (seja dito entre parênteses) porque os textos estão mutilados, são notas dos alunos, apontamentos muito mal tomados e foram mal transmitidos pela tradição editorial. Pois não há nada mais educativo para a técnica filosófica do que a leitura de Aristóteles.
Mas, além da técnica filosófica, como já advertíamos nas lições anteriores consagradas ao método da filosofia, surge a distinção que vai abrindo caminho cada vez mais no pensamento atual, entre explicar por causa físico-mecânica e compreender por finalidade essencial. Pois essa distinção (confesse-se ou não) é aristotélica, ou. melhor dito, não é que a distinção seja aristotélica, mas é que agora sente de novo a filosofia a necessidade de restabelecer o tipo da inteligibilidade aristotélica, o tipo da inteligibilidade que consiste em que o todo precede às partes, em que se consideram as coisas e as essências como os fins, como os selos que dão caráter compreensível a uma coisa. E fenômenos como o aparecimento em psicologia da teoria da figura ou o aparecimento em biologia da teoria do neovitalismo, são fenômenos que no fundo, embora não se declare, embora não o saibam talvez os mesmos que propagam essas teses, revelam a influência de Aristóteles. [Morente]