inteligência

II. — A Inteligência.

129. — A Inteligência é chamada por Plotino, o Nous, muito mais raramente o Logos (Verbum) como os estoicos e Filon. Vindo de Deus por emanação necessária, existe necessariamente desde toda a eternidade. Contudo, ela é verdadeiro efeito, e pode definir-se-lhe a natureza mediante a aplicação dos dois aspectos do princípio fundamental.

A) Degradação.

Manifesta-se sob o tríplice ponto de vista da unidade, da verdade e da bondade.

1) A Inteligência já não possui a absoluta simplicidade do Uno, porque implica essencial dualidade : a do sujeito e a do objeto. Não é unicamente pura intuição, mas em primeiro lugar contemplação doutro ser que é Deus : ” É pensando o Bem que ela se pensa a si mesma “.

2) Em virtude desta inferioridade, não pode esgotar com um só olhar a plenitude transcendente do seu objeto, o Uno. Nela a verdade fragmenta-se na multidão de Ideias; e Plotino adota aqui a célebre doutrina do mundo ideal de Platão, com todas as suas ideias de gêneros, espécies, e até de indivíduos, harmoniosamente hierarquizadas e procedendo desta Ideia suprema mal perceptível, que Platão chamava o Bem, e que Plotino chama o Uno.

3) A menor unidade arrasta menos bondade. A pluralidade das Ideias exige uma espécie de sujeito receptor e multiplicador que, permanecendo de ordem imaterial, divino e infinito, já não tem a plenitude de perfeição do primeiro ato.

B) Semelhança.

Sendo a Inteligência o primeiro efeito, só admite um mínimo de degradação e mantém ainda uma grande semelhança com a unidade, a verdade e a bondade do Uno.

1° Participa da unidade, em primeiro lugar porque o Uno é o único objeto de sua contemplação. Além disso, essas Ideias (permanecendo realmente múltiplas) não são individualidades subsistentes, como para Platão; identificam-se todas com a essência única da Inteligência que as reúne como em feixe de forças específicas distintas mas constituindo um único princípio de atividade. O ” mundo ideal” tornou-se uma única Inteligência pessoal, uma Hipóstase.

2° Participa ainda da verdade imutável. Como as Ideias constituem a sua essência, contém por si mesma todos os pensamentos; não precisa de formar imagens representativas, nem de raciocinar, para adquirir a plena verdade : basta-lhe contemplar-se tal como é : imagem perfeita do Uno; de sorte que não pode incorrer em erro. Daí a sua impressionante. beleza que é o esplendor da verdade : ” Beleza primeira, beleza integral, não há nela coisa alguma onde a sua beleza seja deficiente “.

3° Esta indefectível contemplação da verdade no Uno, permite-lhe não só participar na bondade suprema mas também na perfeição e felicidade definitiva. Plotino chama-lhe um Deus que possui imutavelmente todas as coisas : ” Para que tentar mudar, se possui toda a bondade? Para que tentar engrandecer-se se é perfeitíssima “?. Possui assim ” a verdadeira eternidade da qual o tempo, que envolve a alma…, é imitação “.

130. — Faltaria conciliar esta duas afirmações : As Ideias são realmente distintas; são idênticas à única essência da Inteligência. Plotino limita-se muitas vezes a justapor estas duas conclusões que refletem o duplo aspecto do seu princípio fundamental. ” O ser que pensa, dirá ele, há-de ser ao mesmo tempo um e dois… E forçoso, pois, que seja ao mesmo tempo simples e que não seja simples “.

Eis a explicação de Bréhier : ” A inteligência é visão do Uno, e por isso mesmo é conhecimento de si e conhecimento do mundo inteligível… A concepção mais profunda que se possa ter do mundo inteligível é a de uma sociedade de inteligências ou, se se quer, de espíritos cada um dos quais pensando-se a si mesmo, pensa todos os outros, não formando, portanto, senão uma Inteligência ou Espírito único “.

Mas é, sobretudo, a propósito da alma, onde se encontra uma dificuldade semelhante, que Plotino a examina e resolve.