O tema essencial da Odisseia contada por Homero consiste no périplo de volta do rei de Itaca a seu país. É uma peregrinação às fontes. Essa volta se apresenta como uma série de provas iniciáticas, durante as quais ele aborda sucessivamente terras cada vez mais setentrionais. Primeiro a ilha dos Lotófagos, comedores de lótus, essa flor sagrada dos arianos; depois a terra dos Ciclopes, heróis dos combates pré-cósmicos; a terra de Éolo, rei dos ventos do espaço, intermediário; a terra dos Lestrigons e o rochedo das Pombas que planam sobre as águas primordiais; a ilha de Circeu que metamorfoseou os companheiros de Ulisses em porcos para ressuscitá-los mais jovens e mais belos? a costa da Ciméria, enfim, onde se abre a entrada dos Infernos sombreada de salgueiros.

Ulisses realiza então um sacrifício que lhe permite evocar os mortos, e vê aparecer um povo sutil de sombras que lhe fazem reviver a história mítica dos gregos. Em seguida, retoma o mar e margeia a costa das Sirenes e os perigosos rochedos de Charibde e Skylla Ganha a ilha de Hélios, como único sobrevivente de um naufrágio, e atinge o extremo norte do mundo conhecido, a ilha de Ogígia. É a última etapa antes de regressar ao seu reino de Itaca que atinge a nado, só e nu, como no dia de seu nascimento. Começa então o que M. E. Mireaux chamou justamente um rito sucessorial, nessa época em que a dignidade real não era vitalícia e o assassinato do rei por força ou violência, dava direito à coroa, rito cuja frequência, já assinalamos a propósito de Salomão. O próprio Ulisses, aliás, acaba por seu submetido a ele, sendo morto por seu filho Telégono que, em seguida, desposa a sua viúva Penélope. (Cf. E. MIREAUX, Les poèmes homériques et l´histoire grecque, 1948-1949. O autor reconstitui uma cronologia válida da Odisseia, tornada incoerente no texto estabelecido por ordem de Psístrato depois de seu segundo exílio.) (Benoist)