Pomos a felicidade na vida, e se fizéssemos do viver um termo unívoco, concederíamos a todos os viventes a aptidão para a felicidade, e diríamos que vivem bem em ato aqueles entes nos quais se dá algo idêntico, de que todos os viventes são naturalmente capazes, e não atribuiríamos esta possibilidade ao racional e ao irracional negaríamos; pois a vida seria algo comum, que conferiria a mesma aptidão para ser feliz, se é que a felicidade reside em certo modo de vida. (…)
Mas como a vida se diz de muitas maneiras, e distingue-se uma primeira e outra segunda, e assim sucessivamente, e o viver é um termo equívoco — pois se diz em um sentido da planta, em outro do irracional —, e a diferença se prende à claridade ou à obscuridade, evidentemente algo análogo acontece com a felicidade. (…)
Portanto, se o homem é capaz de possuir a vida completa, o homem que possui esta vida é também feliz. Se não, terá que pôr a felicidade nos deuses, se somente nestes se encontra este modo de vida. Mas visto termos dito que a felicidade existe também entre os homens, ter-se-á que perguntar como existe. E digo que possui a vida completa o homem que não só possui a dos sentidos como também o raciocínio e o entendimento verdadeiro; e isto é também evidente por outras razões. Porém, a possui como outra coisa diversa do que ele é? Não, pois não há em geral um homem que não a possua, ou em potência ou em ato, e deste dizemos que é feliz. (…)
A vida de quem possui este modo de viver é, pois, suficiente. E é capaz de chegar por si só à felicidade e à posse do bem, pois não há bem que não possua. Porém o que procura, procura-o como necessário, não para ele mesmo, mas para alguma das coisas que lhe pertencem. Procura para o corpo ao qual está unido, um corpo vivente, mas que vive do que é próprio do homem. E o homem conhece estas coisas e lh’as dá, sem nada tirar de sua própria vida.