MCC-Bréhier: Tratado 53,3 (I, 1, 3) — A alma usando o corpo como um instrumento

3. Consideremos agora a alma no corpo, se ela existe a princípio antes dele ou somente nele; dela e do corpo se forma o todo denominado animal. Se o corpo é para ela como um instrumento do qual se serve, ela não se restringe a acolher nela as afecções do corpo, do mesmo modo que o artesão não se ressente do que experimentam seus instrumentos: Mas talvez seja preciso que disto tenha a sensação, porque é preciso que ela conheça pela sensação, as afecções exteriores do corpo, para se servir dele como de um instrumento: se servir dos olhos, é ver. Ora, ela apode ser alcançada em sua visão, e por conseguinte, passar por penas, sofrimentos, e tudo aquilo que acontece ao corpo; ela experimenta também desejos, quando ela busca cuidar de um órgão doente.

Mas como estas paixões virão do corpo até ela? Um corpo comunica suas propriedades a um outro corpo ; mas à alma? Seria dizer que um ser sofre a paixão de um outro. Enquanto a alma é um princípio que se serve do corpo, e o corpo um instrumento da alma, eles permanecem separados um do outro; e se se admite que a alma é um princípio que se serve do corpo, se a separa. Mas antes que se tenha atingido esta separação pela prática da filosofia, que era isto? Eles estão misturados: mas como? Ou é uma das espécies de mistura ; ou há entrelaçamento recíproco; ou a alma é como a forma do corpo, e não é separada dele; ou ela é uma forma que toca o corpo, como o piloto toca seu timão; ou uma parte da alma está separada do corpo e se serve dele, e uma outra parte aí é uma mistura e passa ela mesma à classe de órgão; a filosofia faz então retornar esta segunda parte à primeira, e ela desvia esta, tanto quanto nossas necessidades o permitem, do corpo da qual se serve, para que ela não passe todo seu tempo a dele se servir.