MCC-Bréhier: Tratado 53,4 (I, 1, 4) — Aporias concernentes ao sujeito das paixões

5. Mas o que é o animal ? O corpo vivo, o conjunto da alma e do corpo, ou uma terceira coisa oriunda das duas primeiras ? O que quer que seja, ou a alma deve, permanecendo impassível, ser, para o corpo, a causa das paixões, ou ela deve sofrer com ele; e se ela sofre com ele, ela experimenta ou a mesma paixão que ele, ou uma paixão semelhante (por exemplo, a um desejo de animal corresponde um ato ou uma paixão na faculdade de desejar).

Examinaremos mais tarde como padece o corpo organizado ; busquemos agora como padece o composto da alma e do corpo, e, por exemplo, como ele sofre. É porque há tal disposição do corpo, pois esta afeição é transmitida aos sentidos, para enfim a sensação alcançar a alma? – Mas não se vê ainda bem como nasce a sensação. Em seguida, há casos onde a pena começa por uma opinião ou um juízo enunciando que uma infelicidade nos atinja a nós mesmos ou a algum de nossos próximos; daí vem a modificação penosa que se estende ao corpo e ao animal inteiro. – Mas não se sabe se é à alma ou ao composto que se deve atribuir esta opinião. Além do mais, uma opinião sobre o mal não guarda a emoção da pena; esta opinião pode existir, sem que a pena aí se ajunte de todo; pode-se também julgar que se é menosprezado, sem ressentir cólera, ou pode-se pensar em um bem, sem ser movido de desejo.

Em que sentido esta paixões são portanto comuns à alma e ao corpo? É porque o desejo vem da faculdade de desejar, a cólera do apetite irascível, e, em geral, a tendência da faculdade das inclinações? Mas então, as paixões não são comuns à alma e ao corpo; elas pertencem à alma somente. Não, diz-se, ao corpo também; pois é preciso um borbulhar do sangue e da bílis e, em geral, uma certa disposição do corpo para emocionar nossos desejos, por exemplo o desejo sexual. Por outro lado, a tendência ao bem não é uma afeição comum, mas uma afeição própria ao homem, e assim é para várias outras tendências; e há certos argumentos que não permitem relacionar todas as tendências ao composto. Enfim, quando um homem ressente os desejos do amor, é certamente este homem que deseja; mas, em outro sentido, é sua faculdade de desejar. Em que sentido? É o homem que começa a desejar, e a faculdade de desejo segue ? Mas como o homem pode desejar, se sua faculdade de desejar não está em movimento? É portanto ela que começa ; mas como começará, se, de antemão, o corpo não tenha recebido tal ou tal disposição?