mimesis

mímêsis: mímese, mímica, imitação, arte (i. e., bela arte; para as ciências aplicadas, ver techne)

1. A mimesis, em todos os seus cambiantes de significados, é de importância central em Platão. Lemos no Sofista 265b que as artes produtivas (poetikai technai; ver techne) são divididas em artes divinas e humanas (chamadas na Republica 597d-e pythourgia e demiourgia), e que há, além disso, outro tipo de produtividade partilhado tanto por Deus como pelo homem que não produz os «originais» mas apenas cópias (eikones). Esta é a mimesis, arte do poeta, do pintor, do escultor ou do ator que, ao contrário dos outros citados, não usa instrumentos mas cria a imagem na sua própria pessoa (Soph. 267a; Platão usa a mimesis também para a arte do ator, mas para fins de distinção a «mímica» está provavelmente mais próxima do que o contexto exige).

2. O artista (demiourgos) então, quer humano quer divino, produz a dois níveis: «originais» ou objetos reais, e imitações ou imagens que só podem aproximar-se mais ou menos da realidade dos seus modelos. Platão nem sempre é consistente na sua aplicação desta teoria. Na Republica 596b o artista divino cria o original, i. e., o eidos da cama, o carpinteiro produz a cama física que é apenas um eikon vis-à-vis do eidos mas é o «original» para a cama do pintor. No Soph. 265c-d os originais feitos pelo artista divino não são os eide mas os objetos naturais deste mundo, enquanto que os produtos da sua atividade mimética são as sombras e as miragens neste mundo. Finalmente, no Timeu o demiourgos divino não cria os eide preexistentes e este mundo parece ser o produto da sua atividade mimética (Timeu 30c-31b).

3. A confusão nasce sem dúvida da divergência dos contextos e como é óbvio não nos devíamos apoiar demasiado na Forma da Cama ou no demiourgos divino como seu criador; a maior parte do que Platão escreveu sugere a exclusão dos eide para objetos manufaturados e de qualquer fautor para os eide (ver eidos). Mas um ponto é claro: a atividade conhecida como mimesis tem como seu produto uma entidade cujo estatuto ontológico é inferior em relação ao do seu modelo. Assim, ao nível cósmico, este princípio estabelece a relação entre este mundo e o mundo dos eide, fundamenta a teoria platônica do conhecimento, e na esfera moral é o ponto de partida para o seu ataque à «arte».

4. A mimesis é uma das explicações (ver também methexis) ou, melhor, uma das imagens oferecidas por Platão para exprimir a relação dos eide com os particulares sensíveis. Encontra uma expressão bastante elaborada no Parmênides 132c-133a; e de novo no Timeu 30c-d onde o demiourgos toma como modelo (paradeigma) a criatura viva e inteligível (zoon noeton) que abrange todas as Formas e assim cria o kosmos. O mesmo princípio é evidente mesmo antes no Crátilo 298a-c, e por implicação na teoria exposta no Fédon 74a-75a. Aristóteles (Metafísica 987b) declara que a explicação deriva dos pitagóricos que sustentavam que as coisas «imitam» os números e submete isto (ibid. 991a) a uma crítica severa. Embora a mimesis quando aplicada aos particulares sensíveis caia em desuso, o conceito de que o mundo inteligível (kosmos noetos) é o paradeigma para o mundo sensível permanece corrente no platonismo posterior; ver Fílon, De opif. 6, 25; Plotino, Enéadas V, 8, 12.

5. A distinção entre uma realidade «verdadeira» e uma realidade mimética terá óbvias implicações epistemológicas e estas são explicitadas no esquema da linha na República 509d-511e. O verdadeiro conhecimento (episteme) será dos «originais», enquanto a opinião (doxa) é o melhor que se pode esperar atingir ao confrontar o ser imitativo. Mas mesmo aqui há distinções: os particulares sensíveis (ver aistheton), embora imitações dos eide, são em certo sentido «originais» quando comparados com certos fenômenos físicos que são imagens de outros fenômenos, v. g. as sombras e miragens que são «brincadeira» de Deus no mundo físico (ver Sofista 234b, 260b-e). Este conhecimento de imagens (êikasia; ver eikon) é o segmento inferior da Linha (República 509e), mas nesta altura na República Platão nada diz acerca da «brincadeira» do homem no mundo, i. e., arte (mais precisamente, techne poietike mimetike; para o gênero e a diferença, ver techne).

6. O assunto da atividade mimética do homem é explorado na República 595a-608b. Platão distinguiu criação (demiourgia) e arte (mimesis) no Sofista no contexto de uma procura, através da divisão (diairesis), da infima species que é o sofista. Nos passos da República o contexto é fortemente ético e a ênfase algo diferente. Os poetas eram os professores tradicionais da sabedoria, mas na República Platão substituíra-os pelos filósofos; ele reivindica a sua própria posição atacando as qualificações dos poetas para ensinarem a sabedoria.

7. A objeção que Platão faz às belas-artes e dupla: não são verdadeiras e são prejudiciais. Não são verdadeiras no sentido ontológico que já foi discutido: a sua pretensão à realidade é tênue visto que são imitações de imitações (República 597e). Mas, além disso, são culpadas da falsidade do discurso: mentem. Platão julga com consistência a arte pela sua própria pretensão contemporânea de realismo e acha que os retratos que os poetas fazem dos deuses e dos heróis não são exatos pelo fato de retratarem como mau aquilo que é essencialmente bom (República 377d-e). Além disso a arte tem uma finalidade distintivamente moral (ibid. 401b), e se bem que haja obviamente homens maus susceptíveis de serem retratados realisticamente pela arte, ao escolherem retratá-los eles criam perniciosos efeitos morais no observador e até mesmo, se se trata de arte dramática, no próprio ator (ibid. 392c-398b, 606c-608b).

Para as origens miméticas da linguagem, ver onoma; para as suas aplicações ao tempo, chronos; para um elemento mimético em Aristóteles, energeia. [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]


gr. mímêsis / mimesis. Conceito central da estética antiga: a arte (techne), diz Aristóteles, imita a natureza. No plano estético, esta imitação tem por objeto caracteres, paixões e ações (Poét., I): a mimese é a representação mais que a reprodução. Enquanto ela visa a inteligibilidade, tem por conteúdo o universal (Poét. 9). Disto que a arte imita a natureza, Platão tirou, em oposição, uma condenação da poesia: a natureza sensível não sendo ela mesma senão uma imitação do inteligível, a arte é ainda mais longe da verdade. Superior à mimese é o relato, que evita ao espectador a contaminação das paixões representadas. Mas esta análise implica um estatuto ambivalente da mimese: posto que o sensível imita o inteligível, é a mimese que lhe confere realidade e valor e faz dele um kosmos ordenado e belo (Timeu 39e). Plotino não reterá senão a conotação positiva da mimese. [Notions philosophiques]

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