O termo consagrado de pré-socráticos não passa de fórmula cômoda de referência histórica, ou haverá linhas dominantes comuns às diferentes escolas deste período? A dar crédito a Nietzsche e Heidegger, algo teria mudado a partir de Sócrates, e os filósofos pré-socráticos constituiriam a verdadeira tradição filosófica hoje perdida.
Antes de mais, importa notar que todos ou quase todos estes filósofos falam como profetas e fazem vaticínios; apresentam-se como depositários de uma Palavra que lhes vem do Deus, cabendo-lhes a missão de a transmitir aos homens. Em seu entender, é uma visão do Ser que nos funda e não nós quem funda o Ser pela nossa visão, o Sentido não é para construir, mas decifrar. Além disso, a maioria dos Pré-Socráticos escreveu uma obra intitulada Da Natureza e Aristóteles denomina-os de fisiólogos ou físicos (physiologoi). Mas seria grave contrassenso considerá-los físicos no sentido moderno, porque a ideia de uma física com teorias, leis, medidas e instrumentos, tal como hoje a entendemos, é-lhes profundamente alheia. Consideram a Natureza uma força em crescimento e não esse reservatório de materiais e de energias que o homem tende a dominar, para dele se tornar mestre e possuidor. Quanto à Medida, não é para eles o resultado de uma operação quantificante, mas a expressão da harmonia entre as partes e o todo. Quem diz Medida diz, então, estética, ética e ontologia.
A leitura dos Pré-Socráticos pode tornar-se das mais enriquecedoras, na medida em que convida a interrogar-nos se os heróis do saber, em que nos tornamos na nossa civilização científico-técnica, não nos transformaram ao mesmo tempo nos espoliados do Ser. (Jean Brun, “Pré-socráticos”)