ESTRANGEIRO — Nesse caso devemos classificar as ciências do mesmo modo como o fazíamos ao estudar a personagem precedente307?
SÓCRATES, O JOVEM — Creio que sim.
ESTRANGEIRO — Mas, ao que me parece, jovem Sócrates, ele não teria lugar na mesma classificação.
SÓCRATES, O JOVEM — Em qual, então?
ESTRANGEIRO — Em outra.
SÓCRATES, O JOVEM — Sim, é o que parece.
ESTRANGEIRO — E onde poderíamos encontrar o caminho pelo qual poderemos chegar à compreensão do que é o político? É mister que o encontremos e que o separemos dos demais, diferenciando-o por aquilo que lhe é característico, para, a seguir, dar aos outros caminhos, que dele se afastam, um caráter único específico a todos, de sorte a finalmente permitir ao nosso espírito classificar todas as ciências em duas espécies.
SÓCRATES, O JOVEM — Esse trabalho, caro Estrangeiro, parece-me ser teu, e não meu.
ESTRANGEIRO — Entretanto, jovem Sócrates, encontrando esse caminho, ele será tanto teu quanto meu.
SÓCRATES, O JOVEM — Está bem.
ESTRANGEIRO — A aritmética assim como outras artes que lhe são semelhantes não são separadas da ação e dirigidas apenas para o conhecimento?
SÓCRATES, O JOVEM — É verdade.
ESTRANGEIRO — Entretanto, as artes que se relacionam com a arquitetura ou com qualquer outra forma de construção manual estão ligadas originalmente à ação e o seu concurso à ciência faz com que sejam produzidos corpos que antes não existiam.
SÓCRATES, O JOVEM — É certo.
ESTRANGEIRO — Classifiquemos então todas as ciências atendendo a este princípio. Demos a uma parte o nome de ciência prática e, à outra, de ciência puramente teórica.
SÓCRATES, O JOVEM — Sejam essas, se assim o queres, as duas espécies compreendidas na unidade de todas as ciências.
ESTRANGEIRO — Poderemos então admitir que o político, o rei, o senhor de escravos, e o cabeça de casal são uma só coisa, ou haverá tantas artes quantos os nomes pronunciados? Mas segue-me agora num outro caminho.
SÓCRATES, O JOVEM — Qual?
ESTRANGEIRO — Imagina que um leigo seja capaz de dar conselhos a um médico. Não deveremos chamá-lo pelo mesmo nome que damos a esse profissional?
SÓCRATES, O JOVEM — Sim.
ESTRANGEIRO — Pois bem, se um cidadão qualquer é capaz de dar conselhos ao soberano de um país, não poderemos dizer que nele existe a ciência que o próprio soberano deveria ter?
-SÓCRATES, O JOVEM — Sim, poderemos.
ESTRANGEIRO — Mas a ciência de um verdadeiro rei, não é a ciência própria do rei?
SÓCRATES, O JOVEM — Sim.
ESTRANGEIRO — E aquele que a tiver, sendo rei ou simples cidadão, não terá direito, em virtude de sua arte, ao título real?
SÓCRATES, O JOVEM — Certamente que sim.
ESTRANGEIRO — Poderíamos dizer o mesmo do senhor de escravos ou do cabeça de casal?
SÓCRATES, O JOVEM — Sem dúvida.
ESTRANGEIRO — E haverá alguma diferença entre o governo de uma casa e o de uma pequena cidade?
SÓCRATES, O JOVEM — Nenhuma.
ESTRANGEIRO — Assim também, em relação ao problema que discutimos, é evidente que só há uma ciência, quer se diga real, política ou econômica. Sobre isso não discutiremos.
SÓCRATES, O JOVEM — Sim,para que…