KINGSLEY (REALITY:510-513) – O SER/ESTAR-CIENTE QUE SOMOS

Há um ponto crucial a ser observado sobre as instruções de Empédocles para [seu discípulo] Pausânias. Isto é que as coisas que ele lhe diz para fazer são coisas que nós nunca fazemos nós mesmos.

Na verdade, estão completamente além de nossa experiência.

As pessoas podem viver o que para qualquer observador externo pareceria a mais plena das vidas sem ter tocado, nem uma vez, o estado que Empédocles está apontando. E isso ocorre porque passamos toda a nossa vida dormindo em um sonho.

Sua primeira instrução para Pausânias não é perceber, mas perceber que ele está percebendo – observar o próprio processo perceptivo. Em outras palavras, ele está lhe dizendo não apenas para olhar ou tocar ou ouvir, mas para olhar e tocar enquanto estiver plenamente consciente de olhar e tocar, ouvir com a ciência de que está ouvindo.

E quem começar a fazer isso com seriedade começará a se conscientizar de que o que se passa por existência humana comum não passa de um sonho.

Você pode achar fácil, agora mesmo, notar por uma fração de segundo os objetos na frente de seus olhos enquanto também percebe que você os está percebendo; para tomar ciência por um breve momento de todos os sons ou silêncio no fundo. Provavelmente parecerá tão fácil que você se afastará, bastante satisfeito porque agora você sabe que não há mistério aqui para você.

E você estará de volta no sonho.

Este estado de ser/estar-ciente [awareness] é a mais complicada das coisas porque nunca se estende além do momento presente. A razão pela qual Empédocles instrui seu discípulo sobre isso, apresenta a ele como uma prática tão específica, é porque ele não faz ele mesmo. Não é automático, mas dura apenas enquanto você permanecer consciente.

No momento em que você fica fascinado por algo que percebe, você será arrastado pelo nariz para um mundo aparentemente externo de formas e cores em espiral. No momento em que você vagar depois de algum pensamento fascinante dentro de sua cabeça, você ficará com olhos cegos, olhando fixamente para o espaço novamente, surdo aos sons suaves ao seu redor. E é assim que passamos nossas vidas, silenciosamente puxados para trás e para frente de um estado para outro: sempre perdidos, exceto talvez no momento mais fugaz, para nós mesmos.

Para Empédocles, exatamente como para Parmênides, um dos fatos mais extraordinários sobre a existência humana é que as pessoas parecem ser tais criaturas dos sentidos e, no entanto, nunca usam seus sentidos.

Elas são apenas usados ​​por eles [sentidos] – espancadas por eles, esbofeteadas aqui e ali. E o pior desta situação é a forma como conseguimos acreditar, como cegos tão cegos que pensam que não são cegos, que podemos ver o todo.

Mas até agora mal tocamos na superfície do que Empédocles está dizendo a Pausânias nestas poucas palavras, para que ele faça.

Se ele o estivesse instruindo para não apenas a olhar mas se tornar ciente ao mesmo tempo em que olha, isto já seria bastante importante. Todavia, não é isto. Ele o está explicando que, além de estar ciente de tudo que está vendo, também precisa estar ciente de tudo o que está ouvindo; tocando; degustando; sentindo.

Nada deve ficar de fora. Nem a menor preferência deve ser mostrada a um sentido em oposição a qualquer outro. E esse abrangente ser/estar-ciente sem escolha só pode acontecer em um momento específico: agora. Pois se você perder alguma coisa agora, você está perdendo tudo. Você está dormindo novamente.

Até mesmo pensar no que você está fazendo é perder este ser/estar-ciente, porque no momento de pensar você já deixou o momento presente.

A exigência de uma atenção tão completa e intransigente é tão irracional que parece sensato atenuar o que Empédocles está dizendo; querer fazê-lo exigir menos do que realmente está exigindo.

Mas Empédocles não é, para dizer o mínimo, o mais razoável dos professores. E embora a prática que ele acaba de delinear seja muito mais árdua do que nossas mentes errantes podem conseguir, há aquela outra faculdade que ele já mencionou pelo nome que a qualquer momento ou a cada momento está perfeitamente à altura da tarefa — a prontidão insone, sempre presente por sua própria natureza, chamada metis.

Poucas coisas parecem exigir mais esforço do que o processo de se acostumar com esse ser/estar-ciente. Mas nada é mais fácil do que o próprio ser/estar-ciente. E o que parecia impossível no início torna-se mais fácil com o tempo porque, embora cada momento de ciência seja apenas uma ciência em um momento, métis é como um organismo que realmente se nutre. Ou, como Empédocles explica em uma única linha citada de sua poesia por filósofos posteriores que sentiram que deveria significar alguma coisa, mas estavam muito ocupados pensando para ver o que:

Para os humanos, a métis cresce em relação ao que está presente.

Esta frase dele, "em relação ao que está presente", passou a ser comum. Era usada com muita frequência para descrever como alguém familiarizado com os meandros de kairos, com a arte de responder efetivamente às necessidades do momento presente, planejaria e agiria. E isso, é claro, é essencial para o que é métis.

Mas aqui é onde nos encontramos sendo trazidos de volta ao coração daquela tradição à qual Empédocles, junto com Parmênides, pertenciam.

Para ambos, acumular metis o suficiente para se tornar um ser humano eficaz não era mais do que o menor dos começos. Qualquer métis que se realiza quando o navio chega ao porto ou uma corrida de bigas é vencida, dificilmente merece este nome. Para eles, seu valor não estava em ajudá-los a viver a vida humana ao máximo. Em vez disso, o que a tornou crucial foi sua capacidade de levá-los para além da existência humana.

Nada poderia ser mais paradoxal do que esta tradição a que ambos pertenciam. Ensinava que, para nos libertarmos da ilusão, tudo o que precisamos fazer é aceitar a ilusão de todo o coração. Para descobrir o que está por trás do movimento, tudo o que precisamos fazer é abraçá-lo completamente.

E, da mesma forma, para ir além deste mundo dos sentidos, basta usar nossos sentidos ao máximo. Pois abrir nossas "palmas", esses instrumentos da métis, e perceber tudo com total alerta agora mesmo, é abrir o caminho para um mundo de quietude bastante desconhecido para nossas mentes inquietas — é tomar ciência do fator comum que liga cada sentido, imóvel, sem traço, sem lugar e sem tempo, que é a conscientidade [consciousness] que somos.