SCHELLING (Friedrich Wilhelm Joseph von), filósofo pós-kantiano alemão (Leonberg 1775 — Bad Ragaz 1854). Estudou filosofia e teologia em Tubingen e Leipzig. Teve por condiscípulos, na universidade de Tubingen, Hegel e Hölderlin (1790). Logo após, foi professor em Iéna (1798), em Wurzburg (1803) e mais tarde em Erlangen, Munique e Berlim (a partir de 1841), onde ministrou as famosas Lições sobre a filosofia da mitologia e da revelação. A filosofia de Schelling não é um sistema, mas uma sequência de criações geniais e de intuições novas, cuja dominante fundamental é a intuição romântica da natureza como mediadora entre o homem e a divindade. Pode-se fixar três épocas no desenvolvimento de seu pensamento: 1.° a filosofia da identidade (1792-1799), onde Schelling, de início simples comentador de Fichte e “gritador público do eu”, interpreta a identidade do “eu” como uma identidade absoluta do espírito e do mundo; em suma, conduz a identidade, que caracteriza toda tomada de consciência de si (Fichte), ao entusiasmo romântico {Da possibilidade de uma forma da filosofia em geral, 1795; Cartas sobre o dogmatismo e o criticismo, 1796); 2.° a filosofia do espírito (1800-1809), que é uma reflexão sobre o direito, a moral e principalmente sobre a arte como lugar da revelação do divino nas coisas (Sistema do idealismo transcendental, 1800; Diálogo sobre o princípio divino e o princípio natural das coisas, 1802); 3.° a filosofia da religião e da mitologia (1809 até o fim), onde o filósofo esforça-se por reapreender o sentido dos mitos e dos ritos, os princípios gerais de qualquer fabulação, em suma, por explicitar o sentido do imaginário (Filosofia da mitologia, 1842). Tais são os três momentos da “filosofia da Natureza”. Contudo, os temas desenvolvidos em sua “primeira” filosofia são uma constante de sua obra: a participação do homem no Absoluto por intermédio do sentimento, o caráter especulativo de sua filosofia, que não comporta nenhuma doutrina concreta de ação, e finalmente seu caráter de racionalismo dogmático, que leva a explicar todos os fenômenos da consciência humana (notadamente da consciência de ser livre) a partir de uma ordem absoluta que preexiste ao homem (Da essência da liberdade humana, 1809). Nesse ponto, Schelling nada tem de comum com Kant ou Fichte. Ele inspirou, na França, a doutrina de Ravaisson. [Larousse] Friedrich Wilhelm Joseph Schelling (1775-1854) foi o fundador da filosofia da identidade, para o qual o sujeito e o objeto coincidem no Absoluto, que é um estado que pode ser realizado pela intuição intelectual. A filosofia de Schelling culmina num idealismo transcendental, em que a natureza e o espírito fundem-se na identidade, daí afirmar que a natureza é o espírito dinâmico visível, e o espírito, a invisível natureza. A liberdade e a necessidade são as diferentes maneiras de se manifestar uma mesma realidade. Schelling é, assim, monista. [MFS]
Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling nasceu em 1775 e morreu em 1854. De uma singular precocidade em filosofia, publicou em 1795 sua obra Vom Ich als Prinzip der Philosophie; aos vinte anos possuía um sistema filosófico próprio. Em 1800, em plena juventude, escreve seu System des transzendentalen Idealismus, talvez sua obra capital. Esta surpreendente maturidade de seu pensamento, unida a sua longa vida de quase oitenta anos, fez com que a filosofia de Schelling sofresse ao longo do tempo variações fundamentais, podendo-se mesmo distinguir nela quatro fases bem determinadas, que quase chegam a constituir quatro sistemas diferentes.
Schelling é o filósofo de maior influência na época romântica, e deixou sua marca profunda na filosofia, na literatura, na arte e ainda na medicina de seu tempo. Sua formação metafísica procede diretamente de Kant e de Fichte, aos quais continua originalmente; sua obra é, ao mesmo tempo, um constante diálogo com o pensamento hegeliano.
Não é possível entrar aqui no detalhe de complexa filosofia de Schelling, nem se a pode seguir passo a passo nos textos; por isso, limitei-me a escolher uma passagem especialmente representativa, na qual Schelling recolhe e desenvolve a grande ideia do eu como realidade ativa, consistente em fazer, diversa, portanto, do modo de ser das coisas; e onde, por sua vez, insiste energicamente na atitude idealista que havia de roubar tanta fecundidade a essa profunda intuição metafísica. [Marías]
Temos agora Schelling. Schelling é uma personalidade intelectual de tipo completamente diferente de Fichte. Fichte é um apóstolo da consciência moral, é um apóstolo da educação popular. Fichte é um homem para quem todo conhecimento e toda ciência tem que estar submetida ao serviço da ação moral. Ao contrário, Schelling é um artista; a personalidade de Schelling é a personalidade de um esteta, de um contemplativo. Por isso, a filosofia de um e de outro são completamente diferentes dentro desse mesmo esquema geral que expúnhamos antes. Também Schelling parte do absoluto, como Fichte; porém se o absoluto para Fichte era o eu ativo, para Schelling o absoluto é a harmonia, a identidade, a unidade sintética dos contrários, aquela unidade total que identifica num seio materno, naquilo que Goethe chamava as proto-formas, ou, na tradução de uma palavra grega, “as mães” (conceitos mães). O absoluto para Schelling é a unidade vivente, espiritual, dentro da qual estão como em germes todas as diversidades que conhecemos no mundo. E assim essa unidade vivente se põe primeiro, afirma-se primeiro como identidade. Em [tudo quanto é e quanto existe, há para Schelling uma fundamental identidade; tudo é uma e a mesma coisa; todas as coisas, por diferentes que pareçam, vistas de um certo ponto, vêm fundir-se na matriz idêntica de todo ser que é o absoluto.
O primeiro trâmite de diversificação desse absoluto é o que distingue, de um lado, a natureza, e, do outro, o espírito. Essa distinção estabelece os dois primeiros ramos do tronco comum (de um lado, as coisas naturais, e, do outro, os espíritos, os pensamentos, as almas). Mas a distinção nunca é abolição da identidade. A natureza está cumulada de espíritos, como o espírito é a seu modo também natureza.
Schelling tem uma visão extraordinariamente aguda para todos aqueles fenômenos naturais, como são os fenômenos da vida, dos animais, das plantas, que patentemente são fenômenos em que a natureza está maridada, casada, unida com algum elemento vivente, trepidante e espiritual. Porém também fora da natureza viva, na natureza -inerte, inorgânica, encontra Schelling os vestígios do espírito como nessas sutis reflexões que faz sobre a cristalização dos corpos, em que mostra que um corpo, por pequeno que seja, que se cristaliza, por exemplo, em hexaedro, leva dentro de si a forma hexaedro. Por pequeno que seja, um átomo de corpo que cristalize em hexaedro, se se esmaga e se toma a menor partícula, é também um hexaedro. Tem, pois, alma de hexaedro. Há um espírito hexaédrico dentro dele. Essa fusão ou identificação está em todas as diversificações da natureza e do espírito. E em qualquer uma das formas, e em qualquer um dos objetos, e em qualquer uma das coisas concretas que tomamos, vemos e encontramos a identidade profunda do absoluto. [Morente]