Zeus (Dzeús), palavra grega que, conforme Platão em sua obra Crátilo, significa “aquele por meio do qual”.
Zeus é, portanto, a Inteligência divina criadora “por meio da qual” tudo o que existia como Essências e Formas (Arquétipos) no Mundo Pré-Olímpico — que é o Mundo Inteligível, o Mundos das Essências e das Ideias [Eidos] — recebe corpos espirituais no novo Mundo que ele cria.
Zeus é o Noûs–Demiurgo, o Segundo Noûs, que exerce a função de Arquiteto do novo Mundo. Esse Segundo Noûs, o Noûs–Demiurgo também é perfeitamente descrito no início do Corpus Hermeticum [[Hermes Trismegisto. Corpus Hermeticum. Polar: São Paulo, 2019, p. 68.]] e nos Oráculos caldeus [[Fragmento 8]]. Como vimos, ele corresponde ao segundo aspecto ou à segunda “Face” do princípio divino que a tradição Iorubá chama de Obatalá (Oxalá), a primeira Face deste sendo Crono.
O primeiro-Noûs é Crono, a Inteligência divina estrito senso ou o Noûs divino (correspondente à sefirá Bina na Cabala) que olha para as essências que estão espelhadas na Sabedoria divina, Reia (Chochmá na Cabala), e as manifesta dando a elas Formas arquetípicas. A Inteligência demiúrgica: Zeus (o Segundo Noûs), é chamada pela tradição egípcia de Heka, a Magia divina, que conglomerando as forças arquetípicas do Mundo Divino traz para a existência corpos espirituais tangíveis, ainda que espirituais e incorruptíveis. Assim como o Noûs divino deu Formas arquetípicas para as Essências divinas, o Segundo Noûs (o Noûs–Demiurgo) cria para essas Formas arquetípicas corpos espirituais, constituídos de uma corporalidade ou substancialidade espiritual e [77] uma parte ou centelha da Alma espiritual (a segunda Afrodite: neshamá, na Cabala) primordial.
O mito grego, na sequência de seu relato, nos conta então que Reia, seguindo o conselho de sua mãe Gaia, substitui imediatamente o seu sexto filho recém-nascido, Zeus, por uma pedra envolta em roupas de criança, de modo que Crono engole essa pedra pensando se tratar do filho. Enquanto Crono cai no “embuste”, Reia confia o pequeno Zeus aos cuidados das divindades chamadas Náiades, que o criam dentro de uma gruta.
E o mito segue, dizendo que quando Zeus se tornou uma força madura, ele decidiu ajudar sua mãe, Reia, a dar sequência à cosmogonia ou criação dos Mundos, libertando as cinco forças divinas, seus cinco irmãos que estavam no ventre de Crono, seu pai. Para realizar essa ação demiúrgica — criadora dos outros Mundos que nascerão abaixo do Mundo Pré-Olímpico e como “espelhos” dele —, conta com o auxílio de sua primeira mulher, a titânida da segunda geração Métis, que é a Inteligência Prática, e da sua segunda mulher, a titânida da primeira geração Têmis, que é a Justiça divina. Sugere, então, à sua mãe, que a solução é alguém dar a Crono um vomitivo. Reia se oferece para fazer isso e, quando Crono ingere esse líquido, vomita primeiro a pedra e depois Héstia e os seus quatro outros filhos. Tem início assim a criação do Mundo Olímpico, que é o Nível de Realidade no qual passam a existir os entes espirituais criados a partir de seus arquétipos no Mundo Divino, dotados de uma corporalidade, de uma alma espiritual e de uma vontade livre. Apoiando-se na Bondade que está nele e que é um reflexo da divindade supremamente boa (Reia-Crono e Urano-Gaia) que está acima dele e a partir da qual ele cria, Zeus (essa potência divina inteligente de criação universal) [78] busca excluir desse Universo que ele gera toda desordem, e que apenas a beleza e o bem dominem nessa criação: “que não haja nela nada de vil”[[PROCLUS. Théologie platonicienne. Livre V [PROCLO. A teologia de Platão, Livro V]. Paris: Les Belles Lettres, 2018, p. 61.]].