Aristóteles e Epicuro: hedone

7. Aristóteles, fiel ao seu método histórico (ver endoxon), revê tanto as posições hedonistas (Ethica Nichomacos X, 1172a-1174a) como as anti-hedonistas (ibid. VII, 1152b-l 154b). Não se satisfaz com nenhumas nem, de fato, com as objeções postas por Platão. Nega que o prazer seja um processo (ibid. X, 1173a-b), mas acharia preferível chamar-lhe uma atividade (energeia) ou, mais amplamente (ibid. VII, 1153a), «uma atividade não embaraçada com um estado (hexis) caraterístico em concordância com a natureza». De acordo com esta definição o estatuto moral dos hedonai é realizado em termos de energeiai com as quais cada um está propriamente associado. Primeiro, o prazer é um todo, completo em cada momento do tempo, muito semelhante ao ato de ver (ibid. X, 1174b). O prazer é algo que é sobreposto a, e completa uma atividade quando esta não é obstruída, v. g. por um defeito no sujeito ou objeto dessa atividade (ibid. X, 1174b). Eudóxio quase tinha razão: todos os homens parecem de fato desejar o prazer, mas é porque todos os homens desejam viver e o prazer completa a atividade básica do viver; é a vida que é desejável, não o prazer (ibid. X 1175a). Em resumo, são as atividades que são boas ou más, não os seus prazeres sobrepostos (ibid. X, 1175b).

8. Destes pontos de vista diversos, resulta o hedonismo de Epicuro. Como Eudóxio ele é um hedonista de base empírica: o prazer é o bem procurado pelos homens (D. L. X, 128). Mas a prova é a mais sofisticada de Aristipo que aponta para o comportamento instintivo e não aprendido (D. L. X, 137); ver Sexto Empírico, Adv. Math. XI, 96). Aqui há uma correlação com a sua teoria da sensação (aisthesis) baseada no atomismo: tal como a sensação é o critério da verdade, assim também os movimentos ou experiências (pathe) do prazer e da dor, que são concebidos como tipos de deslocação atômica (Lucrécio II, 963-966), servem como critérios do bom e do mau, visto que o prazer é aquilo que é natural, tal como o bem, enquanto a dor é contrária à natureza, da mesma forma que o mal (D. L. X, 34).

9. Epicuro aceita a análise kenosis – endeia – epithymiaanaplerosis do prazer e da dor (D. L. X, 144; confrontar Lucrécio IV, 858-876) e insiste na primazia dos prazeres físicos, particularmente os do estômago (Ateneu XII, 546). Também aceita o corolário de que o prazer, sendo físico, deve ser medido pela quantidade (poson) e não pela qualidade (poion; cf. Eusébio, Praep. Evang. XIV, 21, 3). Mas ao submeter o processo a uma análise ainda mais aturada, Epicuro deteta um outro tipo de prazer mais puro além do corretivo «preenchimento» de uma necessidade física que está, afinal, sutilmente misturada com a dor (ver o comentário perceptivo de Sócrates no Fédon 60b). Este prazer mais puro não é então o prazer cinético da anaplerosis, mas o prazer estático (katastematike) do equilíbrio, a ausência de dor (algos) do corpo (aponia) e a ausência de perturbação da alma (ataraxia) (D. L. X, 131). Esta posição fica a dever bastante ao estado neutro de Espeusipo (ver Clemente de Alexandria, Strom. II, 22, 133), mas o que é evidente é que Epicuro se afastava da explicação mais mecânica de Aristipo que só sustentou o prazer cinético (D. L. X, 136) e desprezou o lado psíquico do prazer. Epicuro, por outro lado, visto que defendeu firmemente a realidade experiencial do passado e do futuro, posição que salienta os prazeres mentais (e as dores), desvia o foco da ênfase do «momento agradável» para «a vida feliz» (D. L. X, 137, 133). Assim é a atividade do espírito que detém as chaves, isto é, a memória e a imaginação, do prazer ao longo de toda a vida feliz, e que controla e tempera o hedonismo epicúreo. [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]