Sabe-se que, para Parmênides, o Ser é a permanência e que a via da Verdade é a que conduz ao Ser do qual não há devir. No seu poema, Parmênides comparava o Ser a uma esfera bem arredondada, imóvel, apertada nos laços fortes da necessidade, permanecendo contínua e contígua a si mesma. Pode dizer-se que, como Heráclito, o Sphairos parmenidiano foi posto em movimento, mas com um movimento que não o faz sair de si mesmo, porque no coração deste movimento mora o Logos que, desde há milhares de anos, constitui o que nos dá o Sentido das coisas e dos seres, Sentido que nem sempre conseguimos apreender. A luta dos contrários brame no coração do Ser que é harmonia e permanece contido no limite de laços poderosos, como o Sol, que jamais franqueará os seus limites. Com Heráclito, o Sphairos parmenidiano foi dotado do poder de se mover sobre ei próprio, mas sem nunca sair de si, porque o devir de que fala Heráclito é um devir no ser e não um devir do Ser.
Empédocles faz do Sphairos a esfera ontológica da qual nada divergiu ainda e que é Espírito sagrado e inefável. Luz pura, ignora as sombras que o Ódio faz surgir das divisões que provoca:
Fixo no espesso invólucro da harmonia O Sphairos é alegre na sua revolução solitária.
Não há discórdias nem lutas indecentes nos seus membros.
Mas é igual em todos os sentidos, semelhante a si próprio e absolutamente sem limites,
Sphairos circular, alegre na sua revolução solitária.
Porque não se vê dois ramos soltar-se a partir do seu dorso,
Não tem pês, nem joelhos ágeis nem órgãos genitais,
Mas é esférico, em todos os sentidos igual a si próprio, (fgt. 27-29)
Nada lhe é exterior, é absolutamente divino, inacessível aos homens. O Sphairos é anterior a qualquer Ódio, qualquer divisão, qualquer fractura; sem ação nem paixão, ignora a luta e o múltiplo: é.
É por referência a este Sphairos primitivo e originário que Empédocles fala de um paraíso perdido e de uma idade de ouro primitiva onde reinava a inocência. De lá os homens foram precipitados sobre a Terra, onde estão sujeitos à luta dos contrários. Somente os homens piedosos voltarão para junto dos deuses, para aí desfrutar de novo a paz e harmonia. Conhecerão, então, de novo, a época em que «todas as criaturas eram familiares e doces para com os homens, tanto os animais selvagens como as aves» (fgt. 130). Era aí o reino da Amizade.
Por isso, o Sphairos divino é o fundamento primeiro de onde nasceram todos os começos. Não é uma unidade entre outras nem a unidade de uma multiplicidade, é Um como a esfera cuja rotundidade é feita de pontos equidistantes de um centro imóvel em tomo do qual gravita uma massa que nunca sai de si mesma e permanece acabada em si. (Jean Brun, “Pré-Socráticos”)