doxa

dóxa: 1) opinião, 2) juízo

Segundo Jayme Paviani, é uma modalidade de conhecimento considerado inferior ou pseudo-conhecimento na perspectiva platônica. Contrapõe-se ao conhecimento, episteme, da ciência (Filosofia e Método em Platão).

1. Opinião: a distinção entre o verdadeiro conhecimento (episteme) e um grau inferior de cognição remonta a Xenófanes (frg. 34), mas a exposição clássica dos pré-socráticos pode encontrar-se no poema de Parmênides (frg. 8, versos 50-61) onde a sensação (aisthesis) é relegada para a posição de «aparência» ou «opinião» (doxa). A distinção baseia-se no estatuto ontológico do objeto da percepção dos sentidos (aistheta) que, em virtude da sua exclusão do domínio do ser verdadeiro (on), não pode ser objeto do verdadeiro conhecimento.

2. A distinção surge de forma idêntica, na epistemologia platônica, embora então a posição tivesse sido fortalecida pelos insistentes ataques dos sofistas à aisthesis como relativa (ver Platão, Teeteto 166d-177a, referindo Protágoras), Na Republica 467e-480a Platão põe a distinção de Parmênides como uma série de correlativos epistemológicos e ontológicos: ao verdadeiro conhecimento corresponde a verdadeira realidade, i. e., os eide, enquanto a ignorância tem como correlato o totalmente não-real. Entre os dois há um estágio intermediário: um quase conhecimento do quase-ser. Esta faculdade intermédia (dynamis) é doxa e os seus objetos são coisas sensíveis (aistheta) e as opiniões vulgarmente sustentadas da humanidade. Os resultados são posteriormente esquematizados no Diagrama da Linha (Republica 509d-511e) onde o domínio da doxa é depois aperfeiçoado ao ser dividido em crença (pistis. q. v.) cujos objetos são os sensíveis, e «conhecimento das aparências» (eikasia), uma categoria de cognição introduzida pelo ponto de vista platônico da natureza da atividade produtiva (ver techne, mimesis).

3. A dicotomia entre episteme e doxa permanece fundamental para Platão, se bem que ele traia um crescente interesse pelo mundo sensível (ver aistheton, episteme).

4. Juízo: o ponto de vista platônico da doxa, baseado como é na separação dos eide das coisas sensíveis, não encontra apoio na visão aristotélica da realidade, mas há um outro contexto dentro do qual a problemática da doxa pode ser tratada. A questão da verdade e do erro surge particularmente no domínio do juízo, problema que também tem as suas origens nas premissas de Parmênides acerca do ser (on. q. v.): uma vez que só o ser pode ser pensado ou nomeado, como é possível fazer um juízo falso, isto é, uma definição acerca do não-ser (frg. 3; fr. 8, verso 34)? No Soph. 263d-264d Platão mostra que, tal como há falsa asserção ou discurso (logos), assim também há falso juízo (doxa) que é a exteriorização deste discurso. As possibilidades do juízo falso são discutidas no Teeteto 187c-200d, mas uma vez que a posição verdadeira resulta da solução do problema do não-ser (me on; ver on, neteron), a análise final não é apresentada antes do Soph. 263b-d: o erro (pseudos) é um juízo (doxa) que não corresponde à realidade, quer à «realidade» da situação sensível quer à verdadeira realidade do eidos do qual o sensível participa.

5. O tratamento que Aristóteles faz da episteme e da doxa desloca-se para outro campo. O conhecimento é ou imediato (ver noas) ou discursivo (dianoia). O último pode ser descrito como episteme se procede de premissas que são necessárias, como doxa se as premissas são contingentes (Anal. post. I, 88b-89b), i. e., se pudessem ser de outro modo, e na verdade Aristóteles define a doxa como «aquilo que podia ser de outro modo» na Metafísica 1039b.

6. Ao discutir os tipos de silogismos in Top. I, lOOa-b Aristóteles trata a contingência da doxa de um ângulo um tanto ou quanto diferente. Um silogismo demonstrativo (apodeixis) assenta em premissas que são verdadeiras e essenciais. Assim ele difere de um silogismo dialético (dialektike) cujas premissas são baseadas em endoxa, definidas agora como opiniões que são aceites pela maioria ou pelos sábios. Para as implicações disto no método aristotélico ver endoxon.

7. O ponto de vista epicurista da doxa compartilha os traços platônicos e aristotélicos. É a opinião, certo movimento espontâneo existente em nós que se aparenta com, mas difere da sensação (aisthesis). Para Epicuro a aisthesis é verdadeira mas não necessariamente auto-evidente (enargeia) e assim a doxa é capaz de se estender para além da evidência dos sentidos como, por exemplo, ao atribuir por meio do seu juízo dados dos sentidos à errada prolepsis, e por isso é a fonte do erro e da falsidade (D. L. X, 50-51). [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters]