Hidra de Lerna

Mitologia Grega – Hércules – Doze Trabalhos – Hidra de Lerna

Paul Diel

Hércules mata a Hidra de Lerna, serpente com múltiplas cabeças que renascem à medida que são decepadas. As cabeças do monstro com corpo de serpente representam os múltiplos vícios (tanto na forma de aspiração imaginativamente exaltada quanto na forma de ambição banalmente ativa), vícios nos quais se “prolonga” o “corpo” da perversidade, a vaidade. Habitando o pântano, a Hidra é mais especialmente caracterizada como símbolo dos vícios banais. Enquanto o monstro viver, enquanto a vaidade não for dominada, as cabeças, símbolo dos vícios, tornarão a nascer, mesmo que, numa vitória passageira, se consiga decepar uma ou outra. Para vencer o monstro, Hércules deve associar à sua espada, símbolo da combatividade espiritual, a tocha flamejante que serve para cauterizar os ferimentos, para que, quando cortadas, as cabeças não voltem a nascer. A chama é, como a água, símbolo de purificação sublime.

Mário Meunier

O segundo trabalho confiado a Hércules foi o de matar a hidra de Lerna. Dragão enorme cujo corpo de réptil era encimado por nove cabeças, a hidra morava nos pântanos lamacentos e mefíticos de Lerna. Quando saía de seu esconderijo, devastava os campos e devorava os rebanhos. Seu sopro era envenenado e qualquer que respirasse seu hálito não tardava a morrer. Em sua luta contra esse flagelo dos campos de Argos, Hércules foi auxiliado pelo fiel companheiro, Iolau. Foi este quem dirigiu, nessa expedição, o carro do herói. Quando ambos chegaram às margens do paul, Hércules, para forçar a hidra a mostrar-se, lançou sobre os caniços uma saraivada de flechas. Depois, como o monstro aparecesse, levantando todas as suas cabeças, ele aproximou-se, tentando abate-las com grandes golpes de clava. Do sangue de uma cabeça abatida, porém, renasciam duas, e a luta, assim, parecia interminável. Hércules chamou Iolau. O zeloso servidor imediatamente pôs fogo a uma floresta vizinha e, com achas acesas, queimava as cabeças que renasciam, impedindo-as de se desenvolverem. Quando a hidra ficou com uma cabeça apenas, Hércules decepou-a e enfiou-a na terra, sob uma grande pedra. O monstro não passava de um imenso cadáver. Antes de ir-se, o filho de Alcmena temperou suas flechas no veneno do terrível animal, tornando-as assim envenenadas.

Robert Graves

O Segundo Trabalho imposto por Euristeu foi a destruição da hidra de Lerna, um monstro nascido da união de Tífon e Equidna e criado por Hera para constituir uma ameaça a Hércules.

b. Lerna está localizada junto ao mar, a uns oito quilômetros da cidade de Argos. A oeste se ergue o monte Pontino, com seu bosque sagrado de plátanos que se estende até a praia. Nesse bosque, limitado de um lado pelo rio Pontino — junto ao qual Dânao dedicou um altar a Atena — e do outro lado pelo rio Amimone, encontram-se as imagens de Deméter, Dionísio Salvador e Prosimna, uma das amas de Hera; e, às margens do rio, ergue-se uma imagem de pedra de Afrodite, dedicada pelas danaides. Todos os anos realizam-se ritos noturnos secretos em homenagem a Dionísio, que desceu de lá para o Tártaro quando saiu em busca de Sêmele, e não longe dali celebram-se os mistérios da Deméter de Lerna num recinto que indica o lugar onde Hades e Perséfone também desceram ao Tártaro.

c. Esse território fértil e sagrado viu-se aterrorizado num determinado momento pela hidra, que mantinha sua guarida debaixo de um plátano na fonte sétupla do rio Amimone e frequentava o insondável pântano de Lerna perto dali — o Imperador Nero tentou determinar sua profundidade mas fracassou —, que se tornou a tumba de vários viajantes incautos. A hidra tinha um enorme corpo de características caninas, e oito ou nove cabeças serpentinas, uma das quais imortal. Mas alguns lhe atribuem cinquenta, cem, e até mesmo dez mil cabeças. De qualquer modo, ela era tão maligna que só o seu hálito venenoso, ou o odor de seu rastro, era capaz de destruir qualquer criatura viva.

d. Atena havia meditado sobre qual seria a melhor maneira de Hércules matar o monstro e, quando ele chegou a Lerna de carro, conduzido por Iolau, ela lhe indicou o local do esconderijo da hidra. Aconselhado pela deusa, ele obrigou a hidra a sair, atirando sobre ela flechas ardentes e, depois, prendeu a respiração enquanto a agarrava. Mas o monstro enroscou-se nos seus pés, no intuito de derrubá-lo. Debalde, Hércules golpeava suas cabeças com a clava, pois, tão logo lhe esmagava uma, nasciam duas ou três no seu lugar.

e. Um caranguejo enorme saiu do pântano para ajudar a hidra, mordendo Hércules no pé. O herói esmagou-lhe furiosamente a carapaça e pediu a Iolau que pusesse fogo a um bosque vizinho. Para impedir que brotassem novas cabeças na hidra, cauterizou suas raízes com ramos em chamas, contendo, assim, o fluxo do sangue.

f. Utilizando então uma espada ou uma cimitarra de ouro, Hércules cortou a cabeça imortal, parte da qual era de ouro, e a enterrou, enquanto ainda silvava, debaixo de uma pesada rocha junto à estrada de Eleu. Depois, ele retirou as entranhas da carcaça e encharcou suas flechas na bile venenosa. Desde então, a menor ferida causada por uma delas resultava sempre fatal.

g. Em recompensa pelos serviços do caranguejo, Hera colocou a sua imagem entre os doze signos do zodíaco; mas Euristeu não quis contar esse Trabalho como devidamente cumprido, pois Iolau havia proporcionado a Hércules os tições.