dóxa (he) / doxa: opinião. Latim: opinio.

A opinião é um conhecimento relativo, tanto em termos de objeto, que está submetido ao devir e à ilusão, quanto em termos de sujeito, que não tem certeza integral sobre ela. Opõe-se a ciência (epistéme). v. essa palavra.

Em Platão, a palavra dóxa tem dois sentidos diferentes; o primeiro é original, o segundo é clássico. É em Mênon (97b-100b) que se encontra o primeiro sentido: a opinião é o primeiro grau da virtude, o grau do homem comum, do não-filósofo, que ainda não conquistou a virtude contemplativa do sábio; ela é então uma adivinhação espontânea do bem que deve ser feito no mundo sensível. Em sua natureza, é um delírio (mania), ou seja, uma emoção. Em sua origem, é um favor divino (theia moira). Portanto, não precisa ser ensinada, ao contrário da doutrina socrática cujas repercussões se encontram no Protágoras (357d):”Não é dom da natureza nem fruto do ensino” (Mênon, 99e).

Para respeitar o sentido clássico, no qual a opinião é um conhecimento incerto, Platão vê-se obrigado a distinguir duas espécies de opinião: a opinião justa (orthè dóxa / orthe doxa) (Mênon, 98b; Banquete, 202a) ou também a opinião verdadeira (alethès dóxa / alethes doxa) (Mênon, 98c; Teeteto, 187b) e a opinião falsa (pseudès dóxa / pseudes doxa) (Teeteto, 187b). Ora, “no que se refere à ação, a opinião justa não é pior nem menos útil do que a ciência, e o homem que a possui vale o mesmo que o sapiente” (Mênon, 98c).

Esse sentido clássico de dóxa aparece com Parmênides, mesmo assim de maneira fugaz (I, 30). Portanto, foi Platão que o usou primeiro de maneira sistemática. Na República (V, 477d-479d), ele a vê como conhecimento mediano, entre a ignorância (agnosía) e a ciência. Dá a essas formas de conhecer um objeto ontológico: a ciência tem como objeto o Ser; a ignorância, o não-ser; a opinião, todo o campo intermediário, ou seja, a aparência (tò doxázein, verbo substantivado) que é um não-ser relativo.

Só incidentemente Aristóteles se refere à dóxa. Em Ética nicomaqueia (VI, IX, 3), ele a opõe à deliberação; no Tratado da alma (III, 3), ele a denomina, sem definir, opinião verdadeira. Em Política (III, IV, 11), ele faz da opinião verdadeira a virtude do governante, enquanto a virtude do homem privado é a phrónesis. Por outro lado, ela ganha grande importância para os estoicos: a dóxa (ou também o dogma) é um falso juízo sobre a realidade, que provoca a paixão, ou seja, uma atitude irracional: medo, tristeza, perturbação. “A morte não é um mal; mal é a opinião que temos de que a morte é um mal” (Epicteto, Manual,V). A opinião, portanto, é uma mentira, e o único método para escapar às paixões é a sua eliminação (a dóxa e dogma Marco Aurélio prefere hypólepsis). Para Epicuro, assim como para Platão, a opinião pode ser verdadeira ou falsa; é esta última a fonte do erro, e não a sensação, que não nos engana jamais (DL., X, 34, 50). Por sua vez, Plotino só emprega a palavra dóxa ocasionalmente, no sentido de ideia difundida (II, I, 2; VI, I, 1). (Gobry)


gr. δόξα, dóxa: 1) opinião, 2) juízo. Segundo Jayme Paviani, é uma modalidade de conhecimento considerado inferior ou pseudo-conhecimento na perspectiva platônica. Para Fraile, as artes e as ciências que se ocupam do estudo da natureza, embora necessárias por sua utilidade para a vida prática, não passam da ordem da opinião (doxa), pois se “aplicam ao que sempre está chegando e nunca chega a ser” (Filebo 59a).


Δόξα é, na verdade, uma opinião, mas na medida em que é formada. Trata-se assim de um parecer, o resultado de me parecer a mim, por exemplo, nos diálogos platônicos, passim δοκεῖ μοι. (CaeiroEN:291 Nota)


Um dos assuntos já discutidos sobre os quais Platão e Aristóteles discordam é o papel da razão na percepção dos sentidos. Platão, será lembrado, afirma que a percepção sensorial pode captar muito pouco sem razão e opinião. Mas Aristóteles nega a razão e a opinião racional (doxa) aos animais e, portanto, permite um conteúdo muito mais rico à sua percepção sensorial, e concede-lhes também uma faculdade informativa para entender como as coisas aparecem, a fantasia, que, diferentemente de Platão, ele distingue nitidamente da doxa racional. Nesta controvérsia, os comentadores platonistas tendem a ficar do lado de Platão e tornam a doxa racional indispensável, pelo menos para o reconhecimento perceptivo. Porém, a pesquisa psicológica moderna favorece a ideia de Aristóteles de que, muito antes da racionalidade, a criança precisa ver o mundo em relação a si mesma, assim sendo melhor pensar na percepção ela mesma como tendo um conteúdo rico. (SorabjiPC1)


O reconhecimento perceptivo requer opinião (doxa) e razão empiricamente baseada (logos)?

De acordo com Aristóteles (SORABJI, 2005, p.33), de modo algum, pois para ele a opinião é uma faculdade racional que os animais não têm., ao passo que os animais por definição têm percepção, e através da percepção o leão pode perceber que o boi está perto. Platão concordou que a percepção é distinta da razão e da crença, mas não que possa alcançar muito sem elas. Em Platão, Teeteto 186A-187A, a percepção pode apreender somente, por exemplo, a brancura, mas não ser e verdade. Ser (ousia), 186C e E, podem ser considerados como incluindo a ideia que algo é branco. Este último requer raciocínio (syllogismos) e crença ou opinião (doxazein), que, em alguns textos, Platão permite aos animais. Aqui, entretanto, ele o nega, pelo menos aos animais e seres humanos recém-nascidos, a quem concede somente percepção. (SorabjiPC1)


Opinion (doxa) has a knowledge (of sensibles) that is free from being passively affected. Perception partakes in a way of this passivity, yet also has a certain cognitivity, insofar as it is seated in the opinionative (doxastikon) (part of the soul) and is illuminated by that, and becomes like reason (logoeides), although irrational in itself. (Proclo, Comentário ao Timeu 1.248,25-9, SorabjiPC1:36)


Platão transformou phantasia em doxa com percepção dos sentidos no Sofista 263e-264d; República 603a. Aristóteles distinguia doxa como apelo por convicção (pistis) e portanto razões (logos). Os estoicos ofereciam uma distinção diferente onde juízo (krisis) e doxa envolvem dar o assentimento (synkatathesis) da razão à aparência. Alexandre de Afrodísias estoiciza, dando esta como sua visão. (SorabjiPC1:61)


No médio-platonismo, doxa foi requerida como suplementar à percepção dos sentidos, mas Proclo vai além e faz doxa e logos penetrar a percepção. Em seu comentário ao Timeu (1 251, 16-17) doxa é percepção racionalizada (logike).

Filopono concede que um cão reconheça seu mestre sem percebê-lo como uma substância, que iriam requerer doxa, de acordo com Proclo. Ao contrário, o cão requer somente impressões em sua imaginação, e Filopono reconhece a importância de um apego emocional em reconhecimento. (Sorabji)


DOXASTIC. This word is derived from doxa, opinion, and signifies that which is apprehended by opinion, or that power which is the extremity of the rational soul. This power knows the universal in particulars, as that every man is a rational animal; but it knows not the di o ti, or why a thing is, but only the o ti, or that it is. (Thomas Taylor)


1. Opinião: a distinção entre o verdadeiro conhecimento (episteme) e um grau inferior de cognição remonta a Xenófanes (frg. 34), mas a exposição clássica dos pré-socráticos pode encontrar-se no poema de Parmênides (frg. 8, versos 50-61) onde a sensação (aisthesis) é relegada para a posição de «aparência» ou «opinião» (doxa). A distinção baseia-se no estatuto ontológico do objeto da percepção dos sentidos (aistheta) que, em virtude da sua exclusão do domínio do ser verdadeiro (on), não pode ser objeto do verdadeiro conhecimento.

2. A distinção surge de forma idêntica, na epistemologia platônica, embora então a posição tivesse sido fortalecida pelos insistentes ataques dos sofistas à aisthesis como relativa (ver Platão, Teeteto 166d-177a, referindo Protágoras), Na Republica 467e-480a Platão põe a distinção de Parmênides como uma série de correlativos epistemológicos e ontológicos: ao verdadeiro conhecimento corresponde a verdadeira realidade, i. e., os eide, enquanto a ignorância tem como correlato o totalmente não-real. Entre os dois há um estágio intermediário: um quase conhecimento do quase-ser. Esta faculdade intermédia (dynamis) é doxa e os seus objetos são coisas sensíveis (aistheta) e as opiniões vulgarmente sustentadas da humanidade. Os resultados são posteriormente esquematizados no Diagrama da Linha (Republica 509d-511e) onde o domínio da doxa é depois aperfeiçoado ao ser dividido em crença (pistis. q. v.) cujos objetos são os sensíveis, e «conhecimento das aparências» (eikasia), uma categoria de cognição introduzida pelo ponto de vista platônico da natureza da atividade produtiva (ver techne, mimesis).

3. A dicotomia entre episteme e doxa permanece fundamental para Platão, se bem que ele traia um crescente interesse pelo mundo sensível (ver aistheton, episteme).

4. Juízo: o ponto de vista platônico da doxa, baseado como é na separação dos eide das coisas sensíveis, não encontra apoio na visão aristotélica da realidade, mas há um outro contexto dentro do qual a problemática da doxa pode ser tratada. A questão da verdade e do erro surge particularmente no domínio do juízo, problema que também tem as suas origens nas premissas de Parmênides acerca do ser (on. q. v.): uma vez que só o ser pode ser pensado ou nomeado, como é possível fazer um juízo falso, isto é, uma definição acerca do não-ser (frg. 3; fr. 8, verso 34)? No Soph. 263d-264d Platão mostra que, tal como há falsa asserção ou discurso (logos), assim também há falso juízo (doxa) que é a exteriorização deste discurso. As possibilidades do juízo falso são discutidas no Teeteto 187c-200d, mas uma vez que a posição verdadeira resulta da solução do problema do não-ser (me on; ver on, neteron), a análise final não é apresentada antes do Soph. 263b-d: o erro (pseudos) é um juízo (doxa) que não corresponde à realidade, quer à «realidade» da situação sensível quer à verdadeira realidade do eidos do qual o sensível participa.

5. O tratamento que Aristóteles faz da episteme e da doxa desloca-se para outro campo. O conhecimento é ou imediato (ver noas) ou discursivo (dianoia). O último pode ser descrito como episteme se procede de premissas que são necessárias, como doxa se as premissas são contingentes (Anal. post. I, 88b-89b), i. e., se pudessem ser de outro modo, e na verdade Aristóteles define a doxa como «aquilo que podia ser de outro modo» na Metafísica 1039b.

6. Ao discutir os tipos de silogismos in Top. I, 100a-b Aristóteles trata a contingência da doxa de um ângulo um tanto ou quanto diferente. Um silogismo demonstrativo (apodeixis) assenta em premissas que são verdadeiras e essenciais. Assim ele difere de um silogismo dialético (dialektike) cujas premissas são baseadas em endoxa, definidas agora como opiniões que são aceites pela maioria ou pelos sábios. Para as implicações disto no método aristotélico ver endoxon.

7. O ponto de vista epicurista da doxa compartilha os traços platônicos e aristotélicos. É a opinião, certo movimento espontâneo existente em nós que se aparenta com, mas difere da sensação (aisthesis). Para Epicuro a aisthesis é verdadeira mas não necessariamente auto-evidente (enargeia) e assim a doxa é capaz de se estender para além da evidência dos sentidos como, por exemplo, ao atribuir por meio do seu juízo dados dos sentidos à errada prolepsis, e por isso é a fonte do erro e da falsidade (D. L. X, 50-51). (Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters)